Aaron Sorkin faz um excelente trabalho na direção de seu segundo filme.

Sinopse: O que era para ser um protesto pacífico se transformou em um confronto violento com a polícia, e o resultado foi um dos julgamentos mais famosos da história.

Os 7 de Chicago é mais um acerto da Netflix para seu catálogo de filmes originais após os bons Resgate, The Old Guard e Enola Holmes. A trama conta a história real de sete (na verdade oito) homens acusados de incitar violência em Chicago na Convenção do Partido Democrata de 1968. A direção ficou por conta de Aaron Sorkin, um dos maiores roteiristas de Hollywood que aqui faz o seu segundo round na direção de longas-metragens e também escreve o roteiro. Antes de tudo, é preciso deixar claro que esse é um filme de tribunal, ou seja, a maior parte da narrativa ocorre dentro das paredes do tribunal de justiça. Não há uma grande ação ou visuais grandiosos, o foco do roteiro é analisar e mostrar cada ação que levou esses homens para a situação na qual se encontram e fazer um retrato realístico dos absurdos que a justiça pode fazer quando utilizada para politicagem.

Inicialmente, somos apresentados aos poucos para os protagonistas e coadjuvantes da trama com um pouco da rotina deles sendo mostrada antes do fatídico dia da Convenção Democrata. Algo que une todas essas diferentes pessoas é o desejo de encerrar a Guerra do Vietnã que mata milhares de soldados americanos todos os dias, porém cada um deles tem métodos, motivações e abordagens divergentes do que deve ser feito para alcançar tal objetivo. O diretor faz questão de diferenciar os ambientes nos quais cada personagem vive e discursa, você tem os hippies que fumam erva, os acadêmicos de esquerda, os mais moderados e os radicais. Cada um desses núcleos cruzam caminhos no dia do protesto, porém não vemos os fatos acontecerem numa linearidade normal, o roteiro opta por apresentar os personagens e já pula para o julgamento, as memórias do evento são reveladas aos poucos com flashbacks que surgem enquanto o caso é reexaminado.

Nem todos os personagens tem destaque no roteiro, algo compreensível dado o número de pessoas envolvidas, o foco fica na figura de Tom Hayden (Eddie Redmayne), Abbie Hoffman (Sasha Baron Cohen), Bobby Seale (Yahya Abdul-Mateen II) e William Kunstler (Mark Rylance). Kunstler é o advogado dos demais réus enquanto que Bobby Seale é o líder do movimento Panteras Negras que foi envolvido na confusão por motivações políticas. Cada bloco da narrativa tem uma boa cadência de eventos e mostra bem o desgaste dos envolvidos conforme o julgamento como também os absurdos que o juiz Julius Hoffman (Frank Langella) orquestrou durante as sessões. Chega a ser agonizante ver uma pessoa que deveria seguir a lei, ser tão despreparada e injusta com os que precisam de ajuda. A atuação de Langella é terrivelmente boa porque apesar dos atos do personagem, não há como dizer que ele é uma pessoa ruim, toda a conjuntura política da época mais a pressão da mídia fizeram tanto os promotores quanto o juiz agirem de forma inapropriada.


William Kunstler é o advogado dos sete réus acusados e faz de tudo em seu poder para tentar provar a inocência do grupo, mas tem que lidar com um juiz mau preparado, além de questões internas de rixas entre seus clientes. A atuação de Mark Rylance é assertiva em transmitir a frustração desse advogado a cada negativa do juiz e pela falta de noção que o magistrado tinha para entender alguns fatos. O diretor faz questão de mostrar que a figura do juiz era problemática não apenas para a defesa como também para os promotores públicos, há um ótima cena onde o promotor Richard Schultz (Joseph Gordon-Levitt) tenta iniciar suas alegações, mas é interrompido inúmeras vezes por Hoffman com questões tão bobas que geram um riso involuntário.

O jogo de câmeras precisava ser muito preciso, pois o espaço confinado permitia pouca movimentação, porém a atuação do elenco fez completa diferença. Sorkin foca a câmera em posições em que a expressão de cada um seja visível e a cada nova reviravolta, os ângulos ficavam mais próximos dando a sensação de que as coisas estavam ficando piores para os réus. Os diálogos do roteiro são outro trunfo, pois além de acertar na linguagem jurídica, também enfatizam corretamente as diferenças retóricas entre cada réu. Num dos melhores diálogos, Abbie Hoffman e Tom Hayden discutem o legado que a luta deles trará para novas gerações e você percebe que apesar de os dois serem muito inteligentes, há um clara linha de pensamento que os separa, apesar de ambos lutarem por causas semelhantes.

Por fim, vale destacar que apesar dos cenários serem limitados, não quer dizer que não existem cenas visualmente impactantes, porém o elemento chocante não é bem o cenário, mas sim o que ocorre nele. Nos flashbacks sobre o dia do protesto, há todo um cuidado para deixar todos os elementos os mais críveis quanto possíveis e a direção não poupa o espectador de nada. Há cenas de violência explícita, agressões, palavreado forte e tentativas de violência sexual, tudo isso filmado com muita maestria sem parecer gráfico apenas para chocar, há um propósito em cada um desses momentos no discurso dos réus sobre suas posições. Minha única reclamação é o fato de que o filme não resiste ao piegas, fazendo algumas cenas bem clichês de patriotismo norte-americano que soam deslocadas da narrativa, os demais elementos técnicos como fotografia, figurino e trilha sonora são bem feitos.

Os 7 de Chicago veio mostrar a justiça humana é imperfeita e comete equívocos. Mais um acerto para a Netflix que teve um ótimo ano com suas produções originais.

Nota: 9,0


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