Ainda que com uma trama lenta, "Um Fascinante Novo Mundo" é uma linda história de amor, que comove e nos faz refletir.
Dando sequência às críticas dedicadas ao mês do
orgulho LGBTQIA+, o filme de hoje é de 2020, mas só chegou aqui no Brasil este ano nos serviços On
Demand e na Apple TV+.
The World To Come, que no país ganhou o nome de Um Fascinante Novo Mundo, é um romance dramático dirigido
por Mona Fastvold, a partir de um roteiro de Ron Hansen e Jim Shepard. O longa é baseado na obra de Shepard, que possui o mesmo nome.
Em sua estreia, o longa recebeu
o prêmio Queer Lion de melhor filme
com temática LGBTQ do festival Internacional de Cinema de Veneza e chamou atenção da crítica especializada. Também não podia se esperar menos de um filme cujo elenco traz nomes de peso como Vanessa Kirby (Pieces of a Woman, The Crown), Katherine Waterston (Animais Fantásticos e Onde Habitam), Christopher Abbott (The Sinner) e Casey Affleck (Manchester à Beira Mar).
O
filme é ambientado no século XIX, mais precisamente na década de 1850, e
acompanha a vida de duas esposas de fazendeiros no interior do estado de Nova
Iorque.
De
um lado temos Abigail (Katherine Waterston) que é a narradora personagem da
trama. Ela e o marido vivem uma vida simples e ainda não superaram a perda de
sua filha. A vida de Abigail se resume basicamente às tarefas
domésticas e escrever em seu diário, onde deixa relatos precisos e muito bem
escritos do seu dia-a-dia e sentimentos mais íntimos.
Do
outro lado temos Tallie (Vanessa Kirby), que acompanhada do esposo, é recém-chegada
na região. Sem filhos e precisando de uma válvula de escape de um
relacionamento abusivo, ela passa a visitar com frequência Abigail e, sem ao
menos esperarem, um profundo amor nasce entre as duas e acompanhamos desde o despertar
desse sentimento até seus desdobramentos no contexto da época.
Para
quem curte o gênero romance, esse filme é uma grande pedida. Sem dúvida, o
grande chamariz dessa obra se encontra em suas protagonistas. O nível de
entrosamento e química entre Waterston e Kirby é simplesmente perfeito e raro de se ver. Além disso, o roteiro é bem construído de modo a nos levar gradualmente ao clímax no último terço do filme. A trama cativa, comove, ao mesmo tempo que nos faz refletir.
Waterston
consegue nos transmitir com profundidade as emoções de Abigail, ainda que sua personagem seja uma
mulher introvertida e que está praticamente ligada no piloto automático, como
se sua luz tivesse simplesmente apagado, desde a morte de sua única filha.
Kirby, por sua vez, se concretiza como uma das melhores atrizes de sua geração. Indicada ao Oscar
por Pieces of a Woman (2020) (confira a crítica AQUI), ela entrega uma mulher
forte, determinada e, ainda que seja a frente de seu tempo, vulnerável. É interessante acrescentar, que mesmo tendo
uma personalidade que nos parece diferente de Abigail, Tallie a compreende e a
admira. Dessa forma, ambas são capazes de conectarem seus universos singulares, ainda que um tanto quanto semelhantes.
Casey
Affleck, apesar de não estar no seu melhor papel dando vida ao esposo de Abigail, Dyer, entrega um marido duro, e que também é resignado.
É interessante acompanhar as nuances de um personagem essencialmente machista,
mas que quando comparado ao personagem Finney, interpretado por Christopher Abbott, chega a
soar até mesmo evoluído, só mostrando o tanto que a sociedade daquele século
era retrógrada e patriarcal.
A
fotografia contribui com a imersão na trama, ressaltando as estações e os
sentimentos, com belíssimos cenários filmados na Romênia. O tempo é algo que é
bastante marcado ao longo do filme, o que permite uma construção da relação das
duas de forma cadenciada e realista. Não é algo que acontece de uma hora pra
outra, o que ajuda a celebrar a espera e cria a ansiedade do encontro das duas. O filme é muito bem produzido artisticamente e tem uma trilha sonora marcante.
Como
era de se esperar, filmes dessa temática retratados em uma época em que a
mulher não tinha espaço podem reservar inúmeros gatilhos e em geral são carregados de tristeza. Portanto, preparem os corações.
Entre tantos acertos, é de se esperar algumas derrapadas, por isso vamos a elas. A trama é lenta e isso pode incomodar uma parte do
público. No entanto, ressalto que seu ritmo é totalmente coerente com a
atmosfera criada. A principal falha na verdade reside na superdose de narrações que acabam pesando a mão com um apelo poético excessivo, que ralenta, soa repetitivo e por vezes alegoriza a história. As locuções certamente são importantes, em especial para nos deixarem a par do
sentimento que Abigail nutre por Tallie, mas não com tanta demasia, pois acaba
tornando maçante determinados trechos, que poderiam simplesmente serem marcados
por uma simples passagem de tempo.
As falhas, no entanto, não são suficientes para tornar Um Fascinante Novo Mundo esquecível. Pelo contrário. Essa obra celebra de forma sensível o amor entre duas mulheres e, certamente, é um grande acerto da indústria cinematográfica.
Nota:
8,0
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