Nem mesmo a poderosa atuação de Brendan Fraser consegue salvar o novo filme de Darren Aronofsky, que é um dos mais sem identidade da carreira do cineasta.

Um professor de inglês recluso que vive com obesidade severa tenta se reconectar com sua distante filha adolescente para uma última chance de redenção.

Em 2021 foi criada muita expectativa em torno do projeto quando ele foi inicialmente anunciado, pois “A Baleia” não só seria o novo filme do aclamado diretor Darren Aronofsky (Mãe!, Cisne Negro), mas adaptaria a premiada peça de Samuel D. Hunter e traria o querido ator Brendan Fraser (Patrulha do Destino, A Múmia) de volta em um grande papel de destaque. A produção da A24 foi envolta de polêmicas, acusada de romantizar ou explorar a dor do personagem de Fraser, que sofre de depressão e obesidade.

Logo de cara vale dizer que Charlie é um personagem bem simpático que não tem como o espectador não sentir empatia por ele. A maquiagem usada para transformar Fraser nele é impressionante e assustadora ao mesmo tempo. Ele é um personagem quebrado que busca uma espécie de redenção nos seus últimos dias, e reparar alguns erros do passado.

A sua filha, vivida pela atriz Sadie Sink (Stranger Things, Rua do Medo: 1978 - Parte 2) é infelizmente uma das piores coisas desse filme. Sink já se provou uma boa atriz no passado, mas a sua personagem é tão difícil de suportar que cansa em vários momentos. Ela é feita para ser detestável, mas o roteiro pesa muito a mão nisso deixando ela caricata demais. Inclusive, em determinado momento parece ter uma reviravolta intrigante sugerindo que a menina é uma pessoa ruim de verdade. Mas na “hora H”, o roteiro amarela e não tem coragem de dar esse rumo para a personagem.

A atuação de Fraser no entanto é realmente o grande ponto alto da produção. Ele mostra a fragilidade de Charlie enquanto mantém a sua doçura e otimismo, sempre buscando o melhor das pessoas. Seu constante sofrimento, gemidos, gritos, tossidas e dores constroem muito bem a sua condição física e mental. Ele realmente merece todo o prestígio que tem recebido nas premiações, e não seria nada absurdo fisgar o Oscar de atuação neste ano.

A atriz Hong Chau (Watchmen, O Menu) vem tendo uma ascensão meteórica na sua carreira nos últimos anos, inclusive sendo indicada a Melhor Atriz Coadjuvante pelo seu trabalho no filme. E esse sucesso todo é muito merecido, já que ela já se provou uma excelente atriz e está sabendo muito bem escolher quais projetos e diretores para trabalhar. Sua personagem é uma enfermeira e amiga de Charlie que cuida dele, com uma interpretação bem cheia de nuances e camadas diferentes.

Mas quem rouba a cena do filme junto com Fraser é a atriz Samantha Morton (Cosmópolis, Minority Report: A Nova Lei), que interpreta a sua ex-esposa. Os dois compartilham uma das únicas cenas que realmente conseguiram despertar algum sentimento em mim, falando sobre o passado, erros e acertos. Uma pena que o resto do filme não conseguiu manter esse nível de qualidade.

O filme tem críticas bem pertinentes à religiões em si, muito enfatizadas no personagem vivido por Ty Simpkins (Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros, Homem de Ferro 3), um jovem garoto missionário que acaba cruzando o caminho com Charlie. Essas críticas são muito bem vindas, principalmente a instituições religiosas que são alguns dos maiores males da humanidade. Mas até nisso o filme pisa na bola e é incapaz de desenvolver profundamente, e se contradiz com a cena final.

O que mais decepciona é a direção de Aronofsky. É tão segura e sem identidade que nem parece um filme do diretor. Em “O Lutador”, ele fez um trabalho semelhante de um filme mais “contido” que fazia um estudo de personagem e que deixava quase toda a carga nas costas da interpretação de um grande ator, mas ainda manteve um estilo visual e direção excelentes e únicos. Aqui, ele só joga tudo nas costas de Fraser, e nem se esforça para brincar com o único cenário ou tentar trazer um dinamismo. Seu trabalho mais fraco até agora na cadeira de direção.

Essa pobreza na direção e cuidado com o filme gera uma falta de sentimento geral. Você até empatiza com Charlie e os seus dramas, mas nunca consegue realmente ter aquele clique com tudo, e o filme está tentando fazer você se importar com todos os personagens.

A conclusão da história é outro ponto bem complicado. O tempo todo o filme e o diretor estão completamente desesperados em fazer o público se emocionar com Charlie, e como todo aluno, deixa pra “entregar” o trabalho na última hora. Nos 5 minutos finais, o filme tenta gerar uma catarse emocional que é só bem cômica, com um final estranho demais que até contradiz as críticas religiosas. Tenho certeza que vai funcionar com muitos, que vão se derramar em lágrimas com a conclusão da história de Charlie, mas pra mim não passa de um final cínico e covarde.

Quando fiz o meu texto de filmes mais esperados de 2022, coloquei “A Baleia” bem no topo. Por ser fã de praticamente toda a filmografia do diretor e pela premissa interessantíssima, não poderia ter saído mais decepcionado com o filme. Fraser carrega o filme nas costas apesar de tudo jogar contra ele, e torço para que continue tendo sucesso e o reconhecimento que merece. Já o filme, bom, é melhor esperar pelo próximo de Aronofsky que ganhamos muito mais.

Nota: 6

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