Minissérie estrelada por Alicia Vikander traz comentários interessantes sobre a indústria do cinema e dos remakes modernos.

A série segue a história de Mira, uma estrela de cinema americana recém-saída de um relacionamento e desiludida com sua carreira. Ela vai para a França para fazer o papel de Irma Vep - um anagrama para "vampiro" - em um remake do filme mudo francês "Les Vampires". Conforme ela assume o papel, a linha entre ficção e realidade começa a ficar turva, e Mira luta para entender o mundo ao seu redor.

O ano é 1996 e o diretor francês Olivier Assayas (Personal Shopper, Vidas Duplas) lançou o filme “Irma Vep”, onde acompanhamos uma atriz chinesa (vivida por Maggie Cheung) estrelando um filme francês que era um remake da série “Les Vampires”. O filme se tornou um clássico cult entre os fãs de cinema por trazer uma abordagem dos bastidores do cinema e as dificuldades técnicas, financeiras e emocionais de se produzir um filme. 26 anos depois, o diretor se reuniu com a HBO e a produtora A24 para realizar um remake de seu filme, se passando nos dias de hoje e no formato de uma minissérie de 8 episódios.

A trama é bem simples: acompanhamos Mira, vivida pela maravilhosa Alicia Vikander (Tomb Raider: A Origem, Ex Machina: Instinto Artificial) que está procurando dar novos ares a sua carreira de atriz, se afastando do cinema blockbuster de ação e partindo para um remake de “Le Vampires”, um clássico cult francês de vampiros lançado entre 1915 e 1916. Ela então dará vida a personagem Irma Vep, uma das primeiras femme fatales da história da cultura pop, e que comanda o grupo de vampiros.

Vemos então todos os bastidores da produção, desde a chegada do elenco, conflitos da visão do diretor com o elenco e todas as tecnicidades da feitura da série. Algo interessante que o diretor adiciona nesse remake de “Irma Vep” são as cenas originais de “Le Vampires”, onde sempre que eles vão começar a filmar algo, o diretor insere os trechos originais para haver a comparação. Isso no entanto fica desgastante com o passar dos episódios, sendo longos e maçantes.

A metalinguagem é também um dos elementos mais fortes da série, com várias alfinetadas ao cinema norte americano e aos filmes de herói da Marvel. No universo seguimos o diretor René (Vincent Macaigne) que está passando por um momento de transição em sua carreira, e decide fazer outro remake de “Le Vampires” depois de ter feito um no início de sua carreira. Isso claramente é uma forma do próprio diretor se colocar na minissérie para expor seus sentimentos, pensamentos e visão sobre o atual momento da sua carreira.

Em uma entrevista para o site Filmmaker, Assayas descreveu que está realmente passando por uma transição em sua carreira, e não enxerga o atual momento do cinema de forma positiva. E assim como em 1996, quando o cinema está em caos, é preciso da ajuda de Irma Vep para salvá-lo. Essa ideia casa com a filosofia da série sobre remakes, que traz uma visão positiva e artística sobre eles, e como podem ser facilmente destruídos pelos produtores e estúdios que visam apenas o lucro.

A minissérie não só atualiza a história de “Irma Vep” para os dias de hoje, mas cria um universo próprio em que o filme original “existe” e tem o mesmo impacto cultural. Enquanto no primeiro filme a roupa da personagem era feita de látex (emulando a personagem Mulher-Gato em Batman: O Retorno), o uniforme da minissérie se assemelha a um pano usado nos filmes de super-heróis atuais da Marvel e da DC. Além dessas sutis mas elegantes diferenças, o diretor obviamente tem mais tempo para desenvolver todos os seus personagens e temas na minissérie.

Todos os personagens da série são fascinantes e interessantes, desde Laurie (Adria Arjona) e o seu relacionamento com Mira (que gerou uma das cenas mais sexys sem envolver nudez que eu já vi) até Gottfried (Lars Eidinger), um problemático ator viciado em drogas que tem uma filosofia de vida um tanto… diferente. Mas os grandes personagens da série com toda certeza são Mira e René.

O personagem de René passa por um arco de renascimento, tendo que enfrentar a depressão, ansiedade e medos de não conseguir corresponder às expectativas de todos (e as suas) com o remake de “Irma Vep”, e precisa recuperar a sua paixão por filmes. Enquanto Mira entra tanto no papel de “Irma Vep” que se torna a personagem, conquistando alguns de seus poderes, personalidade, e transcendendo a sua própria humanidade, vendo e ouvindo os segredos daqueles que ela deseja e inveja. São arcos de personagens magníficos e simbólicos.

O penúltimo episódio traz uma cena realmente bonita sobre qual é a importância dos filmes e séries para o ser humano, quase como se fosse uma forma espiritual de transcender o nosso plano físico. Contar uma história é uma forma de nos conectarmos e criarmos laços uns com os outros, e essa é a importância da ficção e de sempre ter novas histórias e pontos de vista sendo expostos. Só essa cena já faz a série valer completamente, e se tornar um dos grandes lançamentos do ano.

Já o encerramento tem seus altos e baixos. Algumas tramas e personagens são escanteados e não tem suas histórias e arcos terminados, mas em compensação ele consegue criar um desfecho excelente para René e Mira, resignificando a personagem Irma Vep mais uma vez.

“Irma Vep” não vai agradar muitos com o seu ritmo lento e proposta de trazer essa análise minuciosa do cenário atual da indústria cinematográfica, mas é uma série necessária e que todos deviam dar uma chance, apresentando uma narrativa leve e ótimos personagens. O Fantasma de Irma Vep tem assombrado o cinema desde o começo, e deve continuar por muito tempo.

Nota: 8

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