"Heartstopper" entrega uma belíssima trama LGBTQIAP+, repleta de acolhimento, leveza e muito romance.

Pra começar a crítica de hoje, eu já abro enaltecendo o nome por trás da criação, Alice Oseman. 

Ela, que é uma escritora e ilustradora britânica de ficção voltada para jovens adultos, originalmente criou Heartstopper no formato de webcomic (uma espécie de quadrinho online), e rapidamente alcançou mais de 52 milhões de views e uma consolidada fanbase. Com o sucesso, a história mais a frente foi publicada em formato físico e já atingiu um milhão de cópias vendidas, ou seja, um verdadeiro best seller.

Oseman começou a escrever muito cedo e teve seu primeiro livro publicado aos 17 anos. Hoje, com 27 anos, de maneira única, consegue abordar a vida de adolescentes nos dias atuais sob uma ótica muito mais leve (e ainda assim realista) do que boa maioria dos criadores do gênero. 

A See-Saw Films visionária adquiriu os direitos da obra em 2019. Pouco depois, a Netflix anunciou a encomenda de uma temporada e escalou a própria Oseman como roteirista. E eis que a escolha não podia ser mais acertada. Assinando a direção e a produção executiva temos o galês Euros Lyn, conhecido por dirigir alguns episódios de Doctor Who e Black Mirror.

O romance LGBTQIAP+ Heartstopper conta a história de Charlie Spring (Joe Locke), um talentoso estudante do primeiro ano do Ensino Médio assumidamente homossexual e com sérios problemas de autoestima, que se apaixona por seu colega e destaque do time de rugby, Nick Nelson (Kit Connor). O que tinha tudo pra dar errado, já que os amigos de Nick são aqueles típicos estudantes valentões que praticam bullying e que, infelizmente, existem em boa parte dos colégios, surpreendentemente se mostra promissor.

De uma linda amizade floresce um sentimento cada vez mais forte e sincero. E todas essas descobertas, dilemas e emoções dessa fase, nós acompanhamos ao longo de oito episódios de cerca de trinta minutos, com uma delicadeza de abordagem única, que Oseman consegue magistralmente nos proporcionar.

Pra quem acompanhou os quadrinhos, vai logo perceber a essência da autora e a beleza de suas ilustrações presentes. Pra quem não acompanhou, pode até não achar uma novidade a mistura dos quadrinhos ao real, mas é tão fluido  esteticamente que torna-se um elemento fundamental para criar a atmosfera suave da trama.

Vários elementos da webcomic, portanto, sobressaltam a tela, como fontes de texto bem coloridas e joviais, folhas, neve, corações, dando colorido e, especialmente, uma graciosidade a Heartstopper. Até porque quem disse que toda história LGBTQIAP+ tem que ser sempre pesada e dramática pra ser realista? 

Algumas escolhas da história são muito assertivas, por mais simples que possam parecer. O foco aqui são os adolescentes e seus pontos de vista. Os pais até aparecem, mas não recebem destaque. Fica claro que não é sobre eles a história, e a cereja do bolo é que, quando eles aparecem, é pra agirem de forma coerente. Porque existem SIM pais e mães acolhedores, e é legal mostrar e espalhar essa mensagem em alto e bom som! Olivia Colman, que interpreta a mãe de Nick, dá o ar da graça brevemente, porém simplesmente faz toda a diferença quando aparece, e entrega uma das cenas mais emocionantes da temporada.

A série também acerta na direção. O posicionamento das câmeras enfatizando toques, olhares e sorrisos consegue transmitir a sensibilidade e naturalidade dos adolescentes em meio ao seu boom de hormônios e inseguranças.. Uma ou outra bola fora a gente consegue relevar, como por exemplo quando um personagem se encontra ensopado pela chuva e nenhuma toalha lhe é oferecida rs (quem assistir irá compreender).

O casal de protagonistas é de aquecer até o coração mais gélido. A ternura que eles transmitem, imediatamente nos faz torcer por eles. E dá satisfação ver que os dois são caras legais, e que, apesar das inseguranças, estão dispostos a superar os obstáculos do preconceito, uma vez que o dilema cansativo do vai e volta de casais por conta de se assumirem ou não já ficou bastante saturado, senão batido nas séries de modo geral.

Mas não pense que a história só gira em torno de Charlie e Nick. Temos o núcleo de amigos de Charlie com os personagens Tao (William Gao), Elle (Yasmin Finney) e Isaac (Tobie Donovan). Sendo que Tao e Elle têm narrativas próprias e que agregam demais à série. Tao é aquele amigo super protetor, que pode ser possessivo com relação a suas amizades. Elle, por sua vez, é uma menina trans que começa a estudar em uma nova escola e enfretará os obstáculos da adaptação.


Temos representatividade de sobra com  personagens gays, bissexuais, lésbicas e transgêneros. Ainda que com algumas diferenças dos quadrinhos, talvez até mesmo para facilitar a comercialização de outras obras de Alice Oseman, o quarteto de amigos funciona muito bem, assim como seus personagens isoladamente. Vemos importantes pautas sendo debatidas como bullying, homofobia, transfobia, mas especialmente assistimos a importância da amizade e a dificuldade de alguns adolescentes lidarem com mudanças e com o diferente.


O arco das personagens de Tara (Corinna Brown) e Darcy (Kizzi Edgell), núcleo que conhecemos no colégio de Elle, é mais um ponto positivo da história, uma pena que foi pouco desenvolvido.

E deixo aqui minha apreciação por uma personagem que aparece pouco e consegue se sobressair como uma rede de apoio discreta, mas necessária, que é a irmã de Charlie, Tori (Jenny Walser).

Heartstopper é aquela série que deve ser vista. Que vai te deixar pra cima, que enfatiza as redes de apoio, a importância do acolhimento e, especialmente, a importância de se ter liberdade para amar pessoas e ser você de verdade, sem julgamentos.

Nota: 9,0

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