Crítica | Os Caça-Fantasmas (Ghostbusters, 1984)

Os anos 1980 foram responsáveis por produzirem vários clássicos do cinema. É uma década nostálgica para quem já está na casa dos 40 anos (mesmo beirando essa idade, ou ainda até mais), pois temos vários filmes excelentes lançados nessa época, que até hoje são assistidos e lembrados pelos cinéfilos. Até mesmo quem nasceu na própria década de 80 e na de 90 cresceu assistindo tais clássicos, sendo transmitidos repetidamente na TV aberta.

“Os Caça–Fantasmas” é um dos filmes mais icônicos da década de 80 (juntamente com vários outros, vale lembrar), resultando em duas sequências (“Os Caça–Fantasmas 2”, em 1989, e “Ghostbusters – Mais Além”, que está prevista para ser lançada em novembro de 2021), um reboot em 2016 (“Caça–Fantasmas”) e duas séries animadas. A franquia também rendeu uma vasta gama de brinquedos: playmobil com temática do filme, bonecos colecionáveis, action figures, estátuas, réplicas, jogos de videogame e vários outros itens de colecionadores, tais como canecas, porta chaves, bonés e luminárias – itens colecionáveis estes que são frutos de um filme considerado mais do que uma simples obra amada e lembrada entre os cinéfilos.

Escrita por Harold Ramis e Dan Aykroyd, a história se concentra em Peter Venkman (Bill Murray, de “Feitiço do Tempo”, 1993), Ray Stantz (Dan Aykroyd, de “Meu Primeiro Amor”, 1991) e Egon Spengler (Harold Ramis, de “Melhor É Impossível”, 1997), três cientistas do departamento de parapsicologia da Universidade Columbia, em Nova York, que se dedicam ao estudo de casos paranormais. De repente, sua verba é cortada pelo Reitor e os três são demitidos da faculdade. Com isso, Venkman sugere que eles abram seu próprio negócio: a exterminadora de fantasmas “Ghostbusters”.

Ao se instalarem em um prédio desativado do corpo de bombeiros, utilizando–o como quartel general, e adaptar uma ambulância Cadillac, nomeado de Ecto–1, para realizar as atividades, o trio ganha notoriedade capturando ectoplasmas e outras manifestações sobrenaturais pela cidade. Mas, seu maior desafio será enfrentar criaturas sinistras quando um portal para outra dimensão é aberto em Nova York e a poderosa força sobrenatural ameaça destruir toda a cidade.

Com um orçamento de US$ 30 milhões de dólares (o que é bastante para a época, considerando os valores monetários no ano de 1984), “Os Caça–Fantasmas” arrecadou cerca de imensos US$ 291 milhões de dólares; chegando a ser o segundo filme de 1984 com maior arrecadação, perdendo o topo da lista para o filme “Um Tira da Pesada”, que estreou no mesmo ano e com uma diferença de apenas US$ 5 milhões.

O sucesso de “Os Caça–Fantasmas” foi tão grande que Dan Aykroyd fez uma pequena participação no filme “Gasparzinho, o Fantasminha Camarada” (1995), reprisando seu personagem Ray Stantz. Curiosamente, sua única fala no filme é justamente a frase: “Who ya gonna call? Somebody else...”, fazendo uma referência à frase cantada na música tema do filme.

Não só de bom roteiro, boa direção e bom elenco se fazem um ótimo filme; muitas vezes um ótimo filme depende de uma trilha sonora igualmente ótima e que seja marcante. Hoje em dia, perdeu–se (mais do que um pouco) a presença de filmes com músicas temas próprias, que estejam atreladas aos longas, enriquecendo–os musicalmente. Exemplos típicos de filmes que possuem músicas temas próprias, podemos lembrar dos seguintes: “Top Gun – Ases Indomáveis” (1986); “Os Goonies” (1985); “De Volta Para O Futuro” (1985); “Dirty Dancing – Ritmo Quente” (1987); “Flashdance” (1983) e “Footloose – Ritmo Louco” (1984), entre vários outros. Com “Os Caça–Fantasmas” não foi diferente. Outro gigantesco fruto que “Os Caça–Fantasmas” gerou foi a música tema, “Ghostbusters”, interpretada pelo compositor e cantor Ray Parker Jr., que se tornou um enorme sucesso musical. Rendeu a Ray Parker Jr. uma nomeação ao Oscar na categoria de Melhor Canção Original e uma indicação para o Globo de Ouro na categoria de melhor canção original para o cinema, além de vencer o BAFTA na categoria de melhor canção original – todos em 1985. E não parou por aí: também foi gravado um videoclipe, cantado por Ray Parker Jr. e dirigido pelo mesmo diretor do filme, Ivan Reitman. O videoclipe alcançou a posição número 1 na MTV, inovando a produção e indústria de videoclipes. Além de mostrar cenas do filme, o videoclipe contou com várias participações especais, tais como Danny DeVito, John Candy e Chevy Chase.

E tem mais: “Os Caça–Fantasmas” chegou a ganhar um show especial no parque temático da Universal Studios Florida, localizado na Flórida; porém, o show foi encerrado em 1997. O carro dos Caça–Fantasmas, nomeado de Ecto–1, participou de vários desfiles da “Macy`s Holliday Parade” (desfile tradicional de feriado da loja Macy`s, em Nova York), na versão interna do parque. Porém, a Ecto–1 deixou de participar dos desfiles em 2005 depois que a Universal não renovou os direitos da marca; entretanto, a réplica do edifício de bombeiros dos Caça–Fantasmas ainda continua no parque, mas sem o tradicional logo do lado de fora. Por fim, uma edição remasterizada de “Os Caça–Fantasmas” foi lançada nos cinemas dos Estados Unidos em agosto de 2014, para celebrar os 30 anos do lançamento do filme.

Tudo isso mostra a grandeza e importância que o longa tem entre o público depois de mais de 3 décadas, sendo um dos filmes mais cultuados pelos fãs e que conseguiu resistir ao tempo com enorme força. É inegável o fato de que “Os Caça–Fantasmas” é um marco histórico da indústria cinematográfica, sendo considerado um fenômeno na cultura popular, além de conquistar uma legião de fãs e de influenciar outros filmes.

E não é por menos. Os realizadores de “Os Caça–Fantasmas” conseguiram desenvolver uma história de fantasia muito bacana, familiar, com ótimas dosagens de comédias e ação – misturadas com o sobrenatural – sem se exceder no conteúdo de terror ou apelo sexual. Tudo isso foi muito importante para compor o enredo, que resolveu trocar o terror puro dos filmes clássicos (que também estava em alta na época – tais como “O Enigma de Outro Mundo”, 1982; e “A Mosca”, 1986) por ficção científica de horror misturado com comédia. O que foi excelente, pois, assim, o filme conseguiu agradar e atingir um público alvo maior – não só o público adulto, mas, também, o público adolescente.

Com razão, “Os Caça–Fantasmas” é um caso à parte no que se refere aos elementos supernaturais utilizados para “assustar” e “amedrontar” o público. Fantasmas, eventos sobrenaturais inexplicáveis e monstros demoníacos fazem parte do quadro de fenômenos sinistros presentes no longa. Mas, mais importante do que assustar e amedrontar (o que não foi o caso do filme em tela), o objetivo é saber utilizar esses fenômenos a seu favor – de forma amena – para entregar um roteiro adequado que atinja o propósito desejado pelos idealizadores e, sobretudo, para divertir o público alvo.

Ou seja, “Os Caça–Fantasmas” não é o tipo de filme que deseja colocar medo, muito menos fazer com que o público tenha pesadelos, por pior que suas cenas de horror sejam. Ora, ovos estourando e pulando da caixa em cima da mesa da cozinha sem explicação alguma é algo que realmente impressiona, mas deve–se levar em consideração o contexto sobrenatural que a cena em questão quer passar ao telespectador; e pronto, a cena em questão cumpriu seu propósito, juntamente com a presença dos fantasmas e de todas as outras figuras sinistras que aparecem no filme. E isso sem faltar, também, o incrível, assustador e impressionante Stay Puft, o famoso monstro gigante. É incrível como que Harold Ramis e Dan Aykroyd, os responsáveis pela história original e roteiro, juntamente com a excelente direção de Ivan Reitman, conseguiram utilizar de ideias que, a princípio, somente estavam presentes em filmes de ficção científica de terror e souberam adaptá–la para um outro tipo de ficção científica, mais voltada à comédia e fantasia. Excelente ponto positivo neste quesito.

Aproveita-se o gancho para se falar nos efeitos especiais usados para compor os fantasmas e monstros em geral. É lógico que os efeitos especiais da década de 1980 não podem ser comparados com os de hoje. Mas, mesmo assim, os efeitos especiais daquela época não eram feitos só de efeitos gráficos computadorizados. O grande trunfo foi a grandiosa e excelente direção de arte, responsável pela criação visual das maquetes e toda obra artística, que foram os responsáveis pela produção dos elementos sobrenaturais presentes no filme, além dos fantasmas propriamente ditos.

Outro elemento que merece atenção é o local e veículo usados pela equipe no filme. Além do quartel general, usado como instalações do trio, realmente ser um quartel de bombeiros desativado, o local é nada menos do que o local apropriado para a finalidade das atividades que a equipe caçadora de fantasmas exerce. É impossível tentar imaginar outro local usado como quartel general e, sobretudo, também é impossível imaginar outro tipo de carro utilizado pela equipe, senão uma ambulância adaptada. É surreal como a ambulância, modelo Cadillac Miller–Meteor, de 1959, foi a escolha perfeita para ser utilizada como carro oficial dos Caça–Fantasmas. A Ectomobile, ou Ecto–1, virou sinônimo de carro de colecionador, em se tratando de brinquedos. Até hoje, podemos ver réplicas da ambulância, de marcas variadas (Hot Toys e Hot Wheels, por exemplo), sendo vendidas para amantes de colecionáveis.

Por fim, não se pode deixar de falar no incrível elenco e direção de “Os Caça–Fantasmas”. Enquanto a impecável direção ficou sob comando do excelente Ivan Reitman (de “Um Tira no Jardim de Infância”, 1990), que tem uma enorme carteira de trabalhos, o filme em tela ganhou um time de peso como elenco. Além dos 3 atores já citados anteriormente (Harold Ramis, Dan Aykroyd e Bill Murray), “Os Caça–Fantasmas” ainda conta com Ernie Hudson (de “O Observador”, 2000), Sigourney Weaver (de “Alien – O 8º Passageiro”, 1979) e Rick Moranis (de “Querida, Encolhi as Crianças”, 1989). Destaque para o personagem do sempre incrível Moranis, que consegue roubar atenção em algumas cenas da qual participa, além de servir como alívio cômico.

Ainda sobre o elenco, quase que outros atores foram escalados para atuarem no longa. Isso porque, quando Harold Ramis e Dan Aykroyd escreveram o roteiro, eles já tinham em mente os atores John Belushi, Eddie Murphy e John Candy, para representarem Dr. Peter Venkman, Winston Zeddmore e Louis Tully, respectivamente. Porém, John Belushi faleceu à época em que o roteiro ainda sendo escrito e nem Eddie Murphy ou John Candy poderiam participar, pois ambos já estavam envolvidos em outros projetos – inclusive Eddie Murphy teve que recusar “Os Caça–Fantasmas”, pois já estava filmando o filme “Um Tira da Pesada” (1984), que estreou no mesmo ano. Com isso, Ernie Hudson e Rick Moranis foram escalados para os personagens de Winston Zeddmore e Louis Tully; bem como a do Dr. Peter Venkman foi ocupada por ninguém menos que Bill Murray, graças à seu enorme talento para improvisar – inclusive, quase todas as falas de Murray foram improvisadas durante o longa.

Indiscutivelmente, “Os Caça–Fantasmas” é um maravilhoso fenômeno cultural que marcou época e foi inovador em sua forma de produzir filmes do gênero, principalmente porque deu um espetáculo com seus efeitos visuais (ótimos para a época), com sua trilha sonora contagiante (hit de sucesso, sendo uma das mais notáveis músicas dos anos 80 e 90; e que continua sendo uma música clássica até hoje), com presença grandiosa do competente elenco (atores e atrizes altamente de peso, que se destacaram em seus personagens e passando a impressão de que os papeis foram escritos para eles) e, para finalizar, com um roteiro espetacular, criativo, dinâmico, divertido, que pode ser assistido com toda família até hoje, pois o longa envelheceu bem e continua engraçado.

“Os Caça–Fantasmas” vai ganhar uma sequência direta (recebendo o título “Ghostbusters – Mais Além”; com data prevista para novembro de 2021), com participação de alguns atores do longa original (e, claro, com novos atores). Um dos poucos atores originais que não voltará para sequência é Harold Ramis, que interpretou o personagem Egon Spengler, pois, infelizmente, o ator faleceu em 2014. Um fato curioso é que o diretor de “Ghostbusters – Mais Além” é o diretor Jason Reitman (de “Obrigado por Fumar”, 2005), que é filho do diretor do filme original, Ivan Reitman.

“Os Caça–Fantasmas” está disponível para assistir Star+, Amazon Prime Video, Apple TV, YouTube e Google Play.

Nota: 10