"A Festa de Formatura" tem uma linda mensagem, mas que fica apagada no turbilhão de cores e canções. 

Os musicais da Broadway carregam uma magia incontestável. É até muito comum que os grandes espetáculos sejam adaptados para o cinema, a fim de trazer o deslumbre dos palcos e torná-los acessíveis para o público em geral. Algumas adaptações são extremamente marcantes e fizeram sucesso mundial como Grease (1978), Chicago (2002), e Mamma Mia! (2008), enquanto algumas foram um fracasso tão grande, que mais dá vontade de apagar da memória, como é o caso de Cats (2019). Será que isso prova que algumas histórias deveriam permanecer nos palcos, ou que simplesmente a adaptação não é um processo tão simples quanto pode parecer?

A Festa de Formatura (The Prom) é uma comédia musical dirigida por Ryan Murphy adaptada a partir de uma peça musical que teve sua estreia em 2016 e chegou aos palcos da Broadway no ano de 2018. O roteiro do longa, que é assinado por Chad Beguelin e Bob Martin, teve um breve lançamento no cinema no início de dezembro e chegou ao catálogo da Netflix no dia 11 de dezembro. Vale salientar que a história foi inspirada no ocorrido com a estudante Constance McMillen, em 2010, quando esta teve a festa de formatura cancelada após anunciar que iria ao evento com sua namorada.


A trama gira em torno de Dee Dee Allen (Meryl Streep) e Barry Glickman (James Corden), ambos artistas de musicais. Logo na estreia da peça em que atuam juntos, eles recebem uma crítica extremamente negativa que leva o espetáculo ao fracasso. Eles descobrem que um dos fatores preponderantes para o insucesso do projeto é a imagem dos dois, uma vez que são vistos pela audiência como narcisistas. A partir daí eles se juntam à corista Angie Dickson (Nicole Kidman) e ao ator Trent Oliver (Andrew Rannels) para colocarem em prática um plano que eles acreditam que será capaz de reestabelecer a imagem deles frente ao público e imprensa, mostrando que são capazes de demonstrar empatia e ajudar o próximo. O plano tem tudo a ver com Emma Nolan (Jo Ellen Pellman), uma jovem que está em evidência nas redes sociais por um motivo nada bom.

Emma quer o que toda adolescente deseja. Curtir sua a festa de formatura ao lado da pessoa que ama. Mas como moradora de Indiana, especificamente de uma cidadezinha do interior extremamente conservadora, realizar esse sonho não será fácil, já que a pessoa que ela ama é uma outra mulher, Alyssa (Ariana Debose). A representante de pais da escola, interpretada por ninguém menos que Kerry Washington, fará de tudo para impedir que a festa de formatura aconteça na presença da garota que, segundo ela, não tem um comportamento sexual normal. Dee Dee Allen e companhia entram, portanto, em ação para ajudar Emma a ter sua festa de formatura e a quebrar essa visão LGBTQIA+fóbica instaurada nessa comunidade.

Se prestar atenção, a premissa é interessante e o tema debatido é extremamente necessário. Agora imagine tudo isso sendo contado da forma mais colorida e alegre possível. Pois é. O filme é bem a cara da série Glee, até porque está nas mãos de Ryan Murphy. Mas se isso funciona, aí já são outros quinhentos e explicarei melhor a seguir.

Começo pela duração do filme. Suas mais de duas horas seriam facilmente editadas para cerca de uma hora e meia, se a história realmente tivesse sido adaptada ao cinema. Porém temos praticamente uma réplica fiel do musical e nem sempre isso é bom, já que uma coisa é ver um espetáculo como esse ao vivo, onde todo aquele glamour de danças e canções é sentido com vivacidade, outra é achar que o público experienciará isso do mesmo jeito nas telas.

As letras são bem escritas, as performances bem executadas, mas é tudo muito cansativo e repetitivo. Os trechos com diálogos puros ficam reduzidos, visto que são envoltos por uma cortina significativa de canções que quebram o ritmo do roteiro e geram desinteresse.

Os artistas do longa foram escolhidos a dedo e os nomes impressionam. Meryl  Streep tem a voz belíssima e já tinha mostrado esse talento em Mamma Mia!. Ela comprova que não coleciona os prêmios da Academia à toa e exala sua exuberância como é de costume, sendo um espetáculo a parte.

James Corden é famoso por apresentar seu talkshow The Late Late Show. Ele, que ganhou notoriedade especialmente em razão do seu quadro mais famoso Carpool Karaoke, onde canta com celebridades, exibe mais uma vez sua habilidade para o canto. Devo dizer, no entanto, que como ator ele não passou credibilidade o suficiente e ainda comete muitos excessos e vícios interpretativos. Sinto muito, mas é ainda precoce insistir em papéis de destaque para ele (Cats não foi só um sinal). 

Nicole Kidman, por sua vez, está maravilhosa em todos os aspectos, embora tenha me surpreendido encontrá-la desempenhando um papel tão secundário e tão aquém de seu talento. 

Ainda que na presença de Meryl Streep, Kerry Washington é o grande nome do filme. Apesar de ter um tempo de tela reduzido, ela se apropria das cenas mais impactantes da produção ao dar vida a uma personagem ultraconservadora e controladora.

Quanto ao casal principal, Jo Ellen Pellman e Ariana Debose arrasam nos vocais, mas nem tanto na química. Suas vozes são doces e poderosas, em contrapartida o romance de suas personagens não cativa o suficiente e é simplesmente morno.


Entre os acertos do filme estão as mensagens, que mereciam ter mais ênfase, em vez de ficarem perdidas em minutos infindáveis de canções bem ao estilo High School Musical. O filme consegue falar sobre tabus de uma maneira acessível e sensível (talvez sensível até demais), ao mostrar que parte da população cristã que é homofóbica se apega a argumentos bíblicos questionáveis, já que é extremamente seletiva na escolha dos versículos que vai seguir a risca, descartando aqueles que atrapalham suas rotinas. Vemos também que cada um tem seu tempo para entender e aceitar as pessoas como elas são e até mesmo para aceitar a si mesmo. A história retrata ainda o quanto é bom ajudar o próximo e que isso é uma via de mão dupla, onde todos colhem os frutos ao final. Por fim, a felicidade é um direito do qual NINGUÉM deve ser privado.

A Festa de Formatura mostra que tudo deve girar em torno de amar ao próximo acima de tudo. Se todos seguirem essa premissa, as coisas com certeza darão certo.  A frustração fica em saber que o enredo tinha um potencial incrível, mas não foi aproveitado da melhor forma. Se você ama musicais, se aventure e divirta-se, se você tem certas restrições ao gênero, respire fundo antes de dar o play.

Nota: 5,5

 

 

Post a Comment

Postagem Anterior Próxima Postagem