Em 1933, foi lançado King Kong, a icônica obra que introduziu uma das criaturas mais famosas do cinema e da cultura pop do século 20. Em 2005, após a épica trilogia O Senhor dos Anéis, Peter Jackson foi incumbido de criar um remake fiel à obra original, lançada anos antes.

A premissa é relativamente simples: o cineasta Carl Denham parte em uma expedição com a intenção de gravar um filme. Essa viagem, no entanto, se transforma em uma nova jornada quando a tripulação se depara com a Ilha da Caveira, uma terra exótica que abriga não apenas nativos hostis, mas também uma fera de proporções aterradoras, endeusada pelos habitantes da ilha.

(Este texto contém spoilers)

A comparação entre os dois filmes é válida, especialmente quando se considera a diferença entre suas épocas de lançamento, que evidenciam as distintas tecnologias, perspectivas e mensagens de cada período.

Carl Denham e a figura do explorador do mundo primitivo


A figura de Carl Denham apresenta diferenças notáveis, sustentadas pelas épocas de lançamento. No filme de 1933, Carl é um explorador, um desbravador do perigo em um mundo exótico, distante do Ocidente. Ele representa o herói capaz de enfrentar os medos de uma população diante de um inimigo “primitivo” e desconhecido. Não é preciso dizer o quão problemática é essa visão colonialista. No entanto, podemos abrir parênteses aqui para destacar a direção de Merian C. Cooper e Ernest B. Schoedsack. Merian, amplamente aceito como a mente principal por trás da criação de King Kong, e Ernest, co-diretor, não possuem polêmicas raciais associadas a seus nomes. A visão colonialista refletida no filme pertence mais à época do que a uma intenção pessoal dos diretores.


Em 2005, Carl Denham é retratado de maneira diferente, assumindo uma posição mais próxima de um antagonista, comportando-se com arrogância e prepotência. Sua frase icônica “A bela que matou a fera!” é dita com um acentuado cinismo, pois acompanhamos mais de perto suas motivações no remake. Sabemos que tudo, desde a viagem à ilha até a captura do monstro, nasce do desejo megalomaníaco de Denham de alcançar o sucesso como cineasta. Enquanto isso, no filme de 1933, suas ações evidenciam mais um desejo de controlar o medo e o que é considerado primitivo ou bestial.

O remake de 2005 tem pelo menos 1h40min a mais de duração em relação ao original. Essa extensão, já característica de Jackson, permite uma exploração maior dos personagens, não apenas dos aspectos técnicos ou cenográficos, como no original. Contudo, essa longa duração é um dos tropeços do filme, que se perde em seu desejo de grandiosidade.

O Trio


Carl, Ann e Jack (John, no original) ganham papéis mais substanciais no remake. No original, Ann Darrow, interpretada por Fay Wray, tem poucas falas e se limita a gritos de horror, fugindo de Kong, o que evidencia o lado bestial da criatura e seu fascínio pela "dama branca". John Driscoll, por sua vez, é o típico herói, um marinheiro corajoso que resgata Ann das garras da fera. Já em 2005, Naomi Watts, em uma atuação competente, gradualmente estabelece uma conexão com o gorila gigante, enquanto sua relação com Jack (Adrien Brody), que aqui não é marinheiro, mas um roteirista, vai se tornando mais turbulenta. Jack Black interpreta Denham no remake, e sua versão do personagem é mais marcada pela prepotência e arrogância.

Jack Driscoll, é um herói muito mais circunstancial. Ele não é um galã clássico, e o roteiro tenta mostrá-lo como um homem reservado e sensível. Ele discorda das ações de Denham, mas, diante dos desejos da tripulação e da preocupação com Ann, se torna impotente. O público tende a simpatizar com Jack, já que, apesar de não ser um herói tradicional, ele tenta fazer o que é certo, e a atuação de Brody contribui para seu carisma. Por outro lado, o filme não explora tanto o antagonismo de Denham, interpretado por Jack Black, o que contrasta negativamente com a longa duração do filme, que parece subutilizar muitos personagens.

Personagens como Jimmy (Jamie Bell) e Hayes (Evan Parke) aparecem e desaparecem rapidamente, sem o desenvolvimento prometido. Bruce Baxter (Kyle Chandler) faz um paralelo com o personagem de Brody, projetando uma imagem semelhante à de John Driscoll no original: um herói nas telas, mas aqui um covarde fora delas.

O Ápice Tecnológico


Mas o ponto alto de ambas as obras são seus efeitos técnicos. O King Kong de 1933 foi uma revolução em termos de tecnologia. O monstro original foi criado por meio de stop-motion, e o design de produção foi fundamental para a verossimilhança da criatura. Os cenários são gigantescos, e a montagem enfatiza essa grandiosidade, com planos abertos que projetam a imponência de Kong e da Ilha da Caveira sobre os personagens.

O filme de 1933 custou cerca de $700 mil na época, um valor considerável. Foi um sucesso, salvando o estúdio RKO da falência. A bilheteria alcançou $5,3 milhões, o que seria aproximadamente $79.46 milhões nos padrões atuais, com um orçamento estimado de $10.49 milhões (corrigidos pela inflação). Ainda assim estes valores são controversos e são amplamente difundidos como valores aproximados.


Em 2005, Peter Jackson e Andy Serkis trouxeram Kong de volta ao auge da tecnologia. A Weta Digital, estúdio de efeitos especiais fundado por Jackson, liderou os efeitos, e o diretor ressaltou a importância de dar profundidade emocional a Kong, tornando-o um personagem com quem o público pudesse se conectar. A captura de movimento, combinada com o trabalho fenomenal de Serkis, trouxe Kong à vida de uma forma inédita. Isso permitiu que Naomi Watts desenvolvesse uma relação mais complexa com o gorila, diferente do filme original.

É difícil apontar qual filme é melhor. Embora revolucionário, o filme de 1933 é datado, com uma mensagem problemática e um ritmo mais arrastado. Por outro lado, é uma excelente peça de memória cinematográfica e apresenta efeitos impressionantes para a época, além de refletir os medos de uma geração. Já o remake de 2005, embora grandioso, sofre com a duração exagerada e a subutilização de personagens. No entanto, seus efeitos especiais estão à altura dos padrões atuais, e o filme oferece uma visão mais profunda dos personagens principais, além de resgatar fielmente os cenários da Grande Depressão de 1929.

King Kong (1933) | Nota: 5/10
King Kong (2005) | Nota: 7.2/10

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