Coringa: Delírio a Dois foi um filme feito para ser decepcionante, e isso não é necessariamente ruim. Para explicar esse ponto, terei que entrar na zona de spoilers. Então, abordemos primeiramente os aspectos técnicos, que estão isentos.



Com segurança, digo que a sequência se equipara ao original em cinematografia e trilha sonora. Novamente, temos cenas que poderiam ser emolduradas, e a trilha ambiente (as canções abordarei mais à frente) traz todo o peso de uma mente carregada como a do Arthur.


Sinceramente, creio que Joaquin Phoenix poderia facilmente ganhar o Oscar novamente, já que sua atuação não deixa nada a desejar. Lady Gaga também está bem, mas nada fenomenal. Os dois, como casal, não chegam a ter uma química, já que toda a relação entre eles é repleta de nuances.


Antes de entrar nos spoilers, gostaria de ressaltar que, obviamente, quem não gosta de musicais irá odiar este filme. Mas a música aqui tem um propósito, que, em minha opinião, é atingido e bem executado (na maior parte).


SPOILERS ADIANTE!!!


Esse universo criado por Todd Phillips sempre teve a ambição de explorar um Coringa real. Porém, dependendo de suas expectativas, isso será o cerne da decepção.


Creio que existe um fluxo dicotômico na narrativa que, de algum modo, se sustenta harmonicamente. Por um lado, através das canções, temos acesso ao lado lúdico e imaginativo da narrativa. Por outro espectro, vemos toda a crueza e antipatia do mundo real.


Esses dois conceitos vão se misturando na mente do espectador propositadamente, já que há momentos em que a música é claramente imaginativa, outros totalmente reais e, em alguns, há uma ambiguidade subjacente. E isso funciona, pois nossas mentes funcionam desse modo: continuamente imaginamos cenários que nunca acontecem, enquanto outros acabam por se concretizar.


Logo no início, temos uma animação: A Sombra do Coringa. Ela é a chave para a interpretação do filme, já que apresenta o conceito junguiano de “Sombra”, que se refere ao lado oculto da personalidade, muitas vezes reprimido. O dilema aqui passa a ser uma contradição, onde a Sombra (o Coringa) toma conta do indivíduo (Arthur), mas não só dele, como também de nós.


Essa é a razão de este ser um filme polarizado: ele é o oposto do primeiro. Em Joker, vimos um homem com diversos problemas ser humilhado, mas ter sua vingança. Já aqui, vemos a queda de um homem que tenta ser aquilo que acham que ele é.


Como fonte de entretenimento, esse filme é péssimo. Pois, ao fim, Arthur morre como um ninguém, sozinho e sangrando, em um corredor de uma penitenciária. Sem alarde e nem drama; uma morte crua e puramente realista. Seu legado é muito maior do que ele, para Gotham, para Harley, para os presidiários e revolucionários e para nós.


Aos que achavam que veríamos o verdadeiro Coringa nesta sequência — um homem megalomaníaco, genial e caótico —, infelizmente, apenas a completa decepção os aguarda. Vemos somente uma desilusão ser alimentada por pessoas tão fantasiosas quanto nosso protagonista.


Mas, como fui assistir de mente aberta, reconheço que o que o filme se propôs a fazer ele cumpriu satisfatoriamente. Apesar disso, o ritmo é bem arrastado para o final, e confesso, que as canções mesmo que narrativamente coerentes e muito bem executadas, no terceiro ato passaram um pouco do ponto. Porém, com o que foi apresentado no primeiro filme, é uma conclusão perfeita, enquanto insatisfatória às nossas mentes sádicas.


Harley só era apaixonada pelo Coringa, e nós também. Assim como ela, nós só sairíamos satisfeitos se Arthur causasse o caos no tribunal e mostrasse que ele é e sempre foi o Coringa. Mas não, o que mostra que todos temos um pouco da síndrome de Estocolmo.


Esta sequência nunca será amada como o primeiro Joker. E duvido muito que alguém vá se identificar ou terá sua personalidade influenciada pelo Coringa que vemos aqui. Admiro a coragem e originalidade deste filme; não foi só um final triste, mas sim o puro sentimento de frustração que todos experimentamos quando nossas fantasias são confrontadas com a realidade.


Nota: 7.5

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