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Existem
filmes cujas histórias inspiradas em fatos são tão impressionantes, que são
quase inacreditáveis e extremamente impossíveis que tenham acontecido. Mas,
“até as partes mais impossíveis dessa história realmente aconteceram” – frisa
Samuel (John Kani), um dos supervisores da construção da ponte e narrador do
filme, que relata os eventos mórbidos e surpreendentes dos ataques
mortais dos dois leões assassinos responsáveis pelo massacre de mais de 100
trabalhadores ferroviários em Tsavo, Quênia.
Inspirado
na história real dos incidentes de Tsavo, em 1898, e no livro escrito por J.H.
Paterson, “A Sombra e a Escuridão” é um brilhante e épico thriller de ação e
aventura ambientado no coração da África. Com uma abordagem ágil e com um tom
levemente sombrio, o excelente filme entrega uma produção grandiosamente bem
estruturada e bem fiel ao incidente ao mostrar o ser humano lutando contra a
natureza enquanto tenta desbravar e levantar obras da civilização em ambientes
hostis.
Em 1898, o Tenente–Coronel John Patterson (Val Kilmer, de “Top Gun: Maverick”, 2022) é um engenheiro britânico encarregado de ir à África para supervisionar a construção de uma ponte que passa acima do rio Tsavo, no Quênia. Além dos problemas de construção com o relevo do local e com o surto de malária entre os operários, Patterson se depara com dois leões assassinos que começam a aterrorizar e matar os operários da região; paralisando, assim, a construção da ponte.
Porém, os dois leões eram diferentes: eles matavam por prazer e não se intimidavam por nenhuma armadilha ou obstáculo. Com dificuldade de matar os leões, John Patterson conta com a ajuda de Charles Remington (Michael Douglas, de “Homem–Formiga”, 2015), um caçador experiente. Assim, os dois caçadores se lançam em uma perigosa missão para matar os animais e parar com o brutal massacre.
Dirigido por Stephen Hopkins e roteirizado por William Goldman, “A Sombra e a Escuridão” é um tenso thriller de aventura ambientado na África Oriental em 1898, onde os britânicos estavam construindo uma ferrovia para apoiar o comércio de marfim. Durante um período de nove meses, os dois leões selvagens mataram cerca de 135 homens no acampamento de Tsavo. Por uma questão de economia narrativa, o filme em tela faz parecer que houve mais mortes em um período mais curto. Mas, por outro lado, o roteiro de Goldman consegue narrar assiduamente o horror ocorrido no tempo transcorrido em tela.
Diferente
de outros leões, estes não demonstram medo e nem respeito pelo fogo, cercas,
armas ou armadilhas. Pior: eles pareciam matar por prazer, e não por fome. Os
leões eram tão diabolicamente agressivos e astutos, que alguns dos nativos
deduziram que eles não eram simples animais, mas sim espíritos de curandeiros
mortos que vieram aterrorizar o mundo; enquanto outros pensavam que eram
demônios que tinham vindo impedir o avanço do progresso. Assim, os dois leões receberam
os nomes de “Sombra e Escuridão”, ganhando fama entre a população local de
serem demônios.
Embora o longa tenha algumas cenas de ação realmente impressionantes, suas reflexões sobre a natureza do mal tendem a ser mais cerebrais do que viscerais – dada tamanha astúcia dos leões de escaparem de todo e qualquer obstáculo criado pelos caçadores. Desafiando todos os padrões de comportamento conhecidos de tais animais, os dois leões machos atacavam juntos; muitas vezes perseguiam as vítimas à luz do dia, matavam por esporte e não por necessidade, além de não demonstrar medo de fogo ou outros perigos naturais ou armados pelo homem.
Nessa
esteira narrativa, é extremamente difícil tentar explicar porque esses leões em
particular se comportavam dessa maneira. Note-se que essa mesma linha
argumentativa é igualmente explorada em outras produções com leões, tais como
“Caçados” (2007) e “A Fera” (2022), que também abordam sobre caçadores invadindo
o reino animal e pagando caro por isso – embora estes dois últimos filmes não
sejam tão climaticamente intensos quanto “A Sombra e a Escuridão”.
Outro ponto muito bem trabalhado em “A Sombra e a Escuridão” é a respeito do profundo desenvolvimento dos personagens. John Patterson é um homem de ciência, que simplesmente não considera a possibilidade de forças místicas – diferente dos operários da ferrovia, que têm suas próprias crenças. Patterson emprega a lógica e a psicologia para manter seus trabalhadores sob controle por tempo suficiente para, assim, conseguir mais tempo para construir armadilhas com intuito de eliminar os mortais leões. Mas, é só uma questão de tempo até a narrativa colocar Patterson em conflito moral com os operários, que acreditam que as feras realmente são demônios enviados para castigarem o ser humano.
Desta
forma, o diretor Stephen Hopkins e o roteirista William Goldman têm a árdua
tarefa de encontrar um equilíbrio estruturalmente balanceado entre os
incidentes reais e os elementos criativos da história. O maior exemplo é a inserção do personagem de Michael Douglas na trama, que, no caso real, não existiu. Nesse sentido, a dupla é bastante hábil em criar uma alta tensão e um clima real de perigo entre
os operários e os leões, com Patterson no meio do massacre.
Sobre o elenco, Val Kilmer e Michael Douglas entregam performances excelentes, satisfatórias, eficazes e críveis. Kilmer interpreta o confiante e corajoso Patterson com perfeição; enquanto Douglas também brilha especialmente nas cenas que aparece em tela. O elenco coadjuvante tem um ótimo desempenho e bastante memorável. John Kani está incrivelmente carismático como um intermediário local entre os operários da ferrovia e auxiliar da construção da ponte. Bernard Hill (de “O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei”, 2003) é excelente como o médico que perde seus pacientes não somente para doenças locais, mas, também – e, principalmente –, para os felinos assassinos. Por fim, vale destacar a intensa presença de Tom Wilkinson que, mesmo com pouco tempo em tela, entrega o suficiente para personificar um personagem frio e antipático.
A
parte técnica também é impressionante. A Fotografia de Vilmos Zsigmond está
incrivelmente maravilhosa. A Trilha Sonora de Jerry Goldsmith combina perfeitamente
entre os filmes épicos com a música da região. Além disso, os Efeitos Sonoros estão incrivelmente perturbadores e o uso dos efeitos de CGI foi bem
utilizado – mesmo que muitos dos efeitos especiais estejam datados. Por fim,
importante ressaltar que “A Sombra e a Escuridão” ganhou o Oscar 1997 na
categoria de Melhor Edição de Som e, também, ganhou o Globo de Ouro na
categoria de Melhor Trilha Sonora, além de ter sido indicado nas categorias de
Melhor Diretor e de Melhor Filme de Drama; além disso, também foi indicado ao
BAFTA nas categorias de Melhor Filme e Melhor Diretor.
Baseado no livro “The Man-eaters of Tsavo”, publicado em 1907, de John Henry Patterson, o engenheiro que matou os leões, a produção de “A Sombra e a Escuridão” realizou efetivas pesquisas sobre a precisão histórica dos incidentes em Tsavo. O roteiro de Goldman fez uma excelente abordagem do tema “homem versus natureza”, entregando uma alta e bela credibilidade ao enredo. Além disso, o filme em tela apresenta um cenário africano arrebatador ao apresentar, com um tom épico e empolgante, homens brancos desbravando um deserto selvagem e lutando contra a natureza enquanto expande a civilização naquele local.
“A
Sombra e a Escuridão” entrega uma produção elegante e empolgante, com valores
de produção excelentes e performances excelentes. Com uma premissa simples, o
filme em tela é capaz de contar uma impressionante e quase inacreditável
história verdadeira sobre leões assassinos de forma extremamente tensa; além de
conseguir criar uma atmosfera altamente aterrorizante. Com um potencial
cinematograficamente único, a produção entrega um grandioso épico de sucesso
onde há um alto embate entre diferentes tipos de caçadores; e somente um tipo
pode sobreviver.
Por fim, vale uma curiosidade: depois de 25 anos como tapetes de chão de John Henry Patterson, as peles dos leões foram vendidas ao Museu de História Natural de Chicago, nos EUA, em 1924, por uma quantia de US$ 5 mil. As peles dos leões chegaram ao Museu em péssimas condições; mas foram reconstruídas, empalhadas e, atualmente, estão em exibição permanente junto com seus crânios. Os dois espécimes de leões são conhecidos como FMNH 23970, que fica em pé, morto em 9 de dezembro de 1898, e FMNH 23969, que fica agachado, morto em 29 de dezembro de 1898. O Museu Nacional do Quênia está tentando recuperar os crânios e as peles dos dois leões.
“A
Sombra e a Escuridão” está disponível no Telecine e na Globoplay.
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