Luca Guadagnino entrega um bom road movie canibal, que esconde uma linda jornada de autodescobrimento de uma jovem.

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Após ser abandonada pela mãe, uma jovem com tendências canibais inicia uma jornada pelo país à procura de seu pai e em busca de respostas.

Antes de começar um aviso: por conta da temática do filme, é bom ressaltar que ele pode causar um grande desconforto para algumas pessoas, tendo cenas gore (mas nem tanto) e diálogos fortes. Então se você for sensível ao assunto, fica o aviso.

Um dos cineastas que mais me chama a atenção nos dias de hoje é o diretor italiano Luca Guadagnino (Me Chame Pelo Seu Nome, Suspiria: A Dança do Medo), que tem uma visão bem interessante e sensível sobre o cinema. Ele retorna então com o seu novo filme, que é um road movie sobre uma jovem canibal, baseado em um romance de Camille DeAngelis e com roteiro adaptado por David Kajganich (The Terror, Invasores).

O universo criado pela autora e o diretor é de longe uma das coisas mais fascinantes desse filme. Nele temos algumas pessoas (como a protagonista) que tem uma atração insaciável por comer carne humana, e é algo que vai piorando quanto mais eles envelhecem. Elas inclusive tem algumas habilidades sobre humanas, como um olfato bem mais apurado, e poder “sentir” quando estão perto de outros devoradores. O filme deixa até mesmo uma sensação de que poderia gerar uma continuação ou derivados, de tão interessante e cheio de possibilidades esse mundo é (embora a história da dupla de protagonistas tenha se fechado muito bem).

A jornada de Maren, a protagonista vivida por Taylor Russell (As Ondas, Perdidos no Espaço) é bem fascinante e fantástica. Com o twist bem forte e abrupto de sua “condição” de comer carne humana, o abandono do pai, e o início da jornada já fazem o filme ficar bem intrigante logo de início. Russell também entrega uma atuação bem convincente, dando bem o sentimento de tristeza/desamparo e os conflitos internos da personagem.

Lee, o personagem de Timothée Chalamet (Duna, Adoráveis Mulheres) que também é uma dessas pessoas que tem o instinto canibal, traz uma nova perspectiva para a protagonista, e serve primariamente apenas como um interesse romântico dela. Porém, seu personagem se mostra cada vez mais complexo e cheio de traumas e motivações interessantes, que culminam em um dos diálogos mais bonitos do filme. Chalamet continua fazendo um bom trabalho como ator, e construindo uma carreira bem interessante e nada previsível da atual Hollywood.

Por se tratar de um filme com personagens canibais, é bem claro que o filme tem cenas bem violentas com pessoas mortas (ou até vivas) sendo devoradas. Entretanto, sinto que o diretor quis focar muito mais na parte dramática e nos conflitos dos personagens do que de fato mostrar cenas mega fortes, usando muito mais os diálogos para causar esse desconforto do que de fato mostrar vários corpos sendo comidos.

E falando na direção, Guadagnino faz um trabalho bem competente dando ênfase na jornada da protagonista e nas belezas, mistérios e horrores desse nosso mundo, explorando muito os cenários e as vastas paisagens, com uma bela fotografia do cinematógrafo Arseni Khachaturan (Beginning, Aviva). Um grande destaque também para a trilha sonora da dupla Trent Reznor e Atticus Ross (Watchmen, Soul), que são provavelmente os meus compositores favoritos da atualidade. Aqui eles continuam a entregar mais trilhas memoráveis e que somam muito ao filme.

Já o elenco de apoio é composto por nomes como Michael Stuhlbarg (Um Homem Sério, A Forma da Água), David Gordon Green (Joe, Halloween), Chloë Sevigny (Meninos Não Choram, We Are Who We Are) e outros. Desses, os que mais realmente se destacam são a dupla Jake (Stuhlbarg) e Brad (Green), trazendo uma boa construção do universo e até mesmo elementos de horror.

Chegamos então ao personagem coadjuvante mais importante (e polêmico) da trama: Sully, interpretado por Mark Rylance (Não Olhe Para Cima, Jogador Nº 1). Sully é um velho devorador que Maren encontra e a interpretação de Rylance é… estranha, para dizer o mínimo. Claro, muitos consideram ela uma das grandes atuações do ano, e de fato é muito estranho dizer se eu de fato gostei ou não dela, pois é um personagem extremamente caricato, e o ator entrega algumas cenas de maneira natural, outras já está completamente estranho e bonachão.

Toda a sequência final do filme no entanto dá uma bela derrapada, se tornando meio uma novela das nove da Globo, com uma montagem de todo mundo alegre, felizes e resolvidos, para o “vilão final” surgir do nada para ameaçar a protagonista da forma mais brega possível.

Apesar de alguns deslizes e estranhezas, “Até os Ossos” é mais um grande trabalho de Guadagnino como diretor. Uma história que na superfície pode parecer chocante, brutal e violenta, mas que no cerne é uma linda jornada de autodescobrimento de uma garota que precisa descobrir os mistérios do seu passado e o que ela realmente é. Não é o melhor filme do ano ou o melhor da carreira do cineasta, mas é uma linda história que merece ser vista.

Nota: 8

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