Há quatro séculos, as grandiosas obras do ilustre dramaturgo inglês William Shakespeare ainda impressionam de forma deslumbrante. As histórias, escritas impecavelmente por uma mente brilhante, sobreviveram ao tempo, nunca esquecidas. E, com certeza, sempre terão espaço para serem contadas.
As
ideias e forma de escrever de Shakespeare são copiadas, reescritas,
transformadas e adaptadas inúmeras vezes ao longo do tempo. “Romeu e Julieta”, “Hamlet”
e “O Mercador de Veneza”. São eternos clássicos, sempre conquistando elogios do
público, onde quer que sejam transmitidos. E, com “Macbeth” não poderia ser
diferente. “Macbeth” já foi adaptado para os cinemas diversas vezes ao longo
dos anos. Vale destacar: “Macbeth: Reinado de Sangue” (1948, dirigido por Orson
Welles), “Trono Manchado de Sangue” (1957, dirigido por Akira
Kurosawa), “Macbeth” (1971, dirigido por Roman Polanski) e “Macbeth: Ambição e
Guerra” (2015, dirigido por Justin Kurzel – e estrelado por Michael Fassbender,
de “12 Anos de Escravidão”).
Agora, a obra ganha vida outra vez nas mãos do visionário e excelente diretor Joel Coen, um dos melhores diretores contemporâneos. Na trama, o Lorde Macbeth (Denzel Washington, de “Os Pequenos Vestígios”, 2021) é um general escocês que, ao voltar de uma guerra e garantir mais uma vitória a seu rei, Duncan (Brendan Gleeson, de “Gangues de Nova York”, 2002), encontra três bruxas no caminho, que o aborda e falam sobre uma visão de que ele será o próximo rei da Escócia. Macbeth fica obcecado para que isso se torne realidade e faz o que é necessário com o objetivo de conquistar a coroa.
Ao
contar a notícia para sua esposa, Lady Macbeth (Frances McDormand, de “Três
Anúncios Para Um Crime”, 2017), Lorde Macbeth rapidamente ganha o apoio e ajuda
dela. Assim, eles planejam o assassinato do rei atual, com o objetivo garantir
o reinado de Macbeth. Para isso, o casal tomará atitudes extremas pelo poder do
país, resultando numa jornada à loucura. No entanto, a sede pelo poder, ganância
e ambição trarão um alto preço, com ambos sendo assombrados pelas terríveis
consequências de seus atos.
“A Tragédia de Macbeth” é primeiro filme em que Joel Coen dirige (e também assina o roteiro) sem contar com a presença de seu irmão Ethan Coen ao seu lado na direção e roteiro; e Joel surpreende ao apresentar esta ousada e belíssima produção sozinho, com a mesma qualidade e excelência com que os Irmãos Coen (de “Onde Os Fracos Não Têm Vez”, 2007) sempre apresentaram juntos ao público.
Mesmo
com mais trabalho ao ter que dirigir esta produção inteira sozinho (além do
roteiro), ainda assim Joel Coen demonstra uma enorme capacidade ao enfrentar o
desafio de comandar esta adaptação feroz e ambiciosa, além de mostrar que
consegue dar conta do recado sozinho – e de forma surpreendente. É um grande
passo na carreira do diretor, que se destaca neste triunfo épico no melhor
estilo Shakespeariano.
Esta famosa peça de Shakespeare, já adaptada inúmeras vezes, ganha, agora nas mãos de Coen, uma vislumbrante e visualmente deslumbrante adaptação, tão grandiosamente explorada em todos os sentidos artísticos, sobre uma história de traição, ambição, poder e loucura. E isso é um enorme triunfo para Coen.
Mas
Coen não realizou esse feito sozinho. Seria por demais pretensioso alegar que
todo o estrondoso sucesso de “A Tragédia de Macbeth” se deu unicamente a Coen.
O diretor conseguiu reunir uma impecável equipe de excelentes profissionais que
integraram a produção do filme em tela. A começar pelo elenco de peso, três
atores excepcionais e de incontestável dom para atuação, como sempre.
Denzel Washington, Frances McDormand e Brendan Gleeson se destacam com uma impactante e forte atuação, digna de Oscar. Denzel Washington e Frances McDormand impressionam, como sempre, com uma simplicidade, porém forte, determinada e eloquente, em suas formas de atuar, que não é nenhum um pouco difícil convencerem com suas falas e encenações um tanto quanto teatrais; o que é extremamente necessário aqui e deu uma leve diferenciada ao tom do filme.
Denzel
Washington prova, mais uma vez, que, embora sua atuação tenha um semblante
calmo e sereno de ser, consegue transpor sua autoridade, determinação e que seu
personagem é tão focado quanto precisa ser; além de exprimir, de forma
brilhante, os sentimentos de sede de poder, ganância, loucura e paranoia.
Frances McDormand também não fica atrás e se destaca perfeitamente em sua
personagem, esposa altamente ambiciosa e vaidosa, demonstrando uma excelente
atuação, como sempre. É uma pena muito grande que Frances McDormand não esteja
concorrendo ao Oscar este ano na categoria de Melhor Atriz pelo seu papel em “A
Tragédia de Macbeth”.
A Direção de Fotografia é assinada por Bruno Delbonnel, que já trabalhou com os Irmãos Coen em várias outras produções. De maneira maravilhosa, Delbonnel entrega um trabalho absurdamente impecável e visualmente lindo, impressionando com um show de luzes e sombras, fazendo o contraste perfeito dessas cores com as tomadas de câmeras e enquadramento. Com certeza, a fotografia em preto e branco foi a melhor forma de apresentar as nuances destas duas cores para exprimir, literalmente, a tragédia de Macbeth, se perdendo dentro de suas próprias ambições, ganância, desespero e loucura. Essa abordagem fotográfica utilizada por Delbonnel, junto com as tomadas de câmeras e enquadramento, igualmente magníficos, exprime com perfeição todo o sentimentalismo exasperado do personagem de Denzel Washington, com claras referências ao trabalho de Ingmar Bergman.
Trabalhando
com Coen pela primeira vez, Stefan Dechant também faz um incrível e impressionante
trabalho com o Design de Produção. Todos os cenários para a produção do filme
em tela foram criados e filmados dentro de estúdio em Los Angeles, claramente
inspirados pelo expressionismo alemão e, também, nas obras de F.W. Murnau e
Fritz Lang. Extremamente detalhista, Dechant entrega um belíssimo e monumental
palacete, digno de reis. Todas essas estruturas arquitetônicas chamam a atenção
pelos enormes espaços vazios dentro dos ambientes, abertos e fechados; e a
ausência quase total de mobília e de decoração nos ambientes acentuam ainda
mais o vazio, predominando com maior intensidade o tom sombrio daquele momento
em que Macbeth está passando, dominado pela ganância, ambição, loucura e
remorso. Estes espaçosos cenários, geometricamente contornados pelas grandes paredes,
portas, janelas e escadarias realçam o vazio e destacam com mais perfeição a
bela fotografia de Bruno Delbonnel que, magistralmente, soube aproveitar tais ambientes
para criar um show de luzes e sombras. Uma combinação perfeita de fotografia,
enquadramento e design de produção.
O filme em tela é um espetáculo visual e artístico, orquestrado magistralmente por Joel Coen, juntamente com uma equipe de peso, na parte de fotografia, design de produção e com atuações igualmente impecáveis e brilhantes. Esta estilosa e fiel adaptação Shakespeariana prova, mais uma vez, que suas obras ainda estão vivas e é habilmente produzida com diálogos teatrais, de forma que deu ao longa em questão um charme a mais em sua narrativa.
Todos
esses elementos juntos são um enorme e belíssimo diferencial, tornando “A
Tragédia de Macbeth” muito lindo de se assistir. É um surpreendente filme que,
com certeza, é um triunfo épico de Joel Coen em seu primeiro trabalho solo na
direção. É uma pena que Coen não tenha sido indicado ao Oscar 2022 na categoria
de Melhor Diretor, e nem que o longa em questão esteja concorrendo na categoria
de Melhor Filme.
“A Tragédia de Macbeth” está concorrendo a três estatuetas do Oscar 2022, nas categorias de Melhor Ator (para Denzel Washington), de Melhor Fotografia e de Melhor Design de Produção.
Confira a lista completa com os indicados ao Oscar 2022, clicando aqui.
“A
Tragédia de Macbeth” é distribuído pela Produtora A24 e está disponível para
assistir na Apple TV+ desde o dia 14 de janeiro de 2022.
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