Thriller nacional aborda a terrível escravidão moderna e tráfico humano que acontece bem debaixo dos nossos narizes.
Para dar uma vida melhor à família no interior, o jovem Mateus aceita trabalhar em um ferro-velho em São Paulo com o novo chefe Luca. No entanto, ele acaba ficando preso no perigoso mundo da escravidão contemporânea com outros garotos e é forçado a decidir entre continuar nessa situação ou arriscar o futuro da família.
Produzido pelas produtoras brasileiras O2 Filmes e Noruz Films, “7 Prisioneiros” é um filme brasileiro que chamou muito a atenção por conta dos seus temas abordados e participação nos Festivais de Cinema de Toronto e Veneza. Rapidamente o longa foi adquirido pela Netflix, que é responsável pela distribuição nacional e internacional, além de promover e fazer campanha para o filme nos festivais e em cabines fechadas com críticos e jornalistas do mundo todo.
A história do filme é bem simples e direta. Temos o nosso protagonista, Mateus (Christian Malheiros) que é um jovem que tem uma vida simples no campo de uma cidade do interior de São Paulo com a sua família, e busca melhorar tanto sua vida quanto a deles. Com a oferta de trabalhar em um ferro-velho na grande São Paulo, Mateus embarca para uma jornada com mais alguns jovens em busca do emprego e melhores condições de vida. Eles logo descobrem que estão presos e obrigados a trabalhar para Luca (Rodrigo Santoro) em condições precárias e sem receber o dinheiro, sofrendo ameaças e violência física.
Logo de cara, o filme apresenta os personagens e seus sonhos, focando muito no abismo social dessas pessoas, que querem apenas melhorar as condições de suas vidas e de suas famílias. O filme constrói bem a animação, personalidade e sonhos dos jovens, que ficam deslumbrados com a cidade de São Paulo e o mar de oportunidades que podem ter, para logo em seguida ter tudo jogado no lixo.
O principal tema abordado pelo filme é a escravidão moderna e o trafico de pessoas que acontece não só no Brasil, mas no mundo todo. Em determinado ponto da trama, vemos diferentes casos e tipos de pessoas (principalmente imigrantes) que sofrem, com cenas tristes e muito pesadas que trazem desconforto extremo ao espectador.
Já a direção de Alexandre Morato (Sócrates), que assina os roteiros junto de Thayná Mantesso, é bem competente e constrói muito bem todo o clima de tensão do filme, certamente um nome para todos ficarem de olho. A fotografia assinada por João Gabriel de Queiroz (Beira-Mar) é bem interessante e possui bons enquadramentos. Destaque para a sequência mostrando a cidade de São Paulo focando nos cabos e postes, que trazem um grande significado para o filme.
O grande chamariz do filme são as interpretações fantásticas de Rodrigo Santoro (300, Westworld) e Christian Malheiros (Sintonia, Sócrates). Sempre que os dois estão em cena interagindo entre si ou com os outros atores, suas presenças dominam a tela e roubam qualquer cena, mostrando o imenso talento que ambos possuem. O contraste entre os dois personagens é super rico e interessante, já que enquanto Mateus é esperançoso, jovem, empático e esperançoso, Luca guarda um rancor enorme em seu coração, se aproveitando dos jovens e já perdeu todo o amor e esperança que um dia já teve.
Já os atores secundários não têm tanto destaque no filme. No começo até existe uma intenção de desenvolver os personagens, mas eles logo são colocados em escanteio, para focar nos dois personagens principais. Algumas falas e atuações soam completamente artificiais em momentos do filme, mas isso é um problema gerado muito mais pelo roteiro do que pelos atores em si. Esses diálogos fazem com que os personagens não soem como pessoas reais, criando caricaturas e tirando o espectador do filme.
A parte mais assustadora e chocante no filme em si para mim não foi nem a violência gráfica ou as ameaças que os familiares das vítimas sofrem, e sim uma sequência onde alguns imigrantes são transportados em uma van preta pelas ruas de São Paulo. O filme gera uma sensação péssima por fazer o espectador se questionar: “Com quantas vans pretas transportando pessoas traficadas nós cruzamos na rua durante o dia a dia sem saber?? Sem saber”. O filme dá esse “tapa na cara” mostrando essa realidade de uma forma bem eficiente.
O terceiro ato traz uma reviravolta previsível (que já estava sendo construída ao longo do filme) mas eficiente, que apresenta ”um novo olhar” para Luca, não necessariamente justificando suas ações, mas mostrando o seu lado e humanizando. E aí que temos um dos maiores problemas do filme.
Embora toque em temas importantes, o filme não desenvolve bem alguns deles e apenas os joga na trama de maneira óbvia. É complicado tratar de uma situação complexa que envolve diversos fatores externos como corrupção e opressão por parte da polícia, milícias e políticos que ativamente contribuem para manutenção desse esquema em apenas 100 minutos, mas o filme opta por focar em uma narrativa mais direta e na transição e aceitação do protagonista de "como o mundo funciona" do que de fato trabalhar nesses aspectos.
“7 Prisioneiros” é um bom thriller que trata de temas muito fortes e extremamente relevantes, podendo abrir os olhos de muita gente sobre esses problemas sociais que são a realidade de muitas pessoas (não só no Brasil). Ele sofre de alguns diálogos mal ajambrados e um mau aproveitamento e exploração total dos temas, mas é um filme necessário que merece ser visto.
Nota: 7
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