"The One" joga no lixo uma ótima história ao entregar um roteiro preguiçoso e personagens que não cativam.
A crença em almas gêmeas permeia a maior parte dos romances que temos por aí. Agora, imagine se existisse um conceito genético por trás disso. E se de fato pudesse haver uma compatibilidade genética capaz de nos tornar completamente atraídos por um parceiro ou parceira? Isso certamente nos pouparia de uma longa procura e dezenas de experiências de namoros ou casamentos mal sucedidas. Usando dessa premissa desenvolve-se The One.
A série britânica de ficção científica e drama conta com oito episódios. Criada por Howard Overman, o show chegou ao catálogo da Netflix no dia 12 de março de 2021.
A história traz Rebecca Webb (Hannah Ware), uma cientista brilhante, fria e calculista que, juntamente com seu amigo, James (Dimitri Leonidas), desenvolve o The One. Basta um fio de cabelo e seus descritores genéticos comporão um gigantesco banco de dados que indicará sua combinação, ou melhor, seu amor verdadeiro. E não pensem que é um golpe ou charlatanismo. Quando os combinados se encontram é como se ambos sentissem que já se conhecem. Algo, literalmente, fora do comum. A explicação científica (fictícia, claro) por trás desse feito é interessante e consegue convencer o telespectador.
Para esse projeto sair do papel, Rebecca e James precisam utilizar meios por vezes desonestos e nada convencionais e isso inclui enganar Ben, um amigo que eles têm em comum, que ainda por cima está apaixonado por Rebecca.
A série mostra parte da repercussão do The One na vida das pessoas. Entre os variados efeitos, está o número de divórcios que cresce vertiginosamente, uma vez que as pessoas querem descobrir quem são realmente suas combinações e, pra isso, estão dispostas a largar seus relacionamentos atuais. Isso além de acender um alerta no governo, gera o ódio nas pessoas que foram afetadas por essa “nova onda”.
Além de lidar com os haters e a impressa, Rebecca terá ainda que encarar uma investigação policial, já que a descoberta do corpo de um homem no Tamisa pode ter alguma ligação com a cientista. Seu império milionário pode, portanto, estar a ponto de desmoronar com os escândalos à espreita.
Como podem ver a história central é extremamente criativa, como toda boa e velha ficção exige. A série tinha tudo pra dar certo, porém já adianto que as boas ideias se transformaram num roteiro preguiçoso e repleto de problemas. Pra começar, o desenvolvimento dos personagens é péssimo, de forma que é praticamente impossível criar empatia por algum deles, em especial a protagonista. Ela, que vive na linha tênue entre o bem e o mal, não convence nem como mocinha, muito menos como vilã, fazendo a trama central ser a menos cativante entre todas. Claro, que o roteiro extremamente contido e com zero surpresas, colaborou bastante para isso.
O ritmo do seriado é lento e reto. Não há momentos de impacto em praticamente nenhum episódio, porque contaminaram o roteiro com situações demais e nenhuma delas é de fato bem desenvolvida ou aprofundada. É aquele tipo de série que vai te fazer mexer no celular enquanto assiste, pra tentar tornar a experiência menos tediosa.
O que faz a série não ser totalmente um fracasso são as tramas paralelas e isso com um curto prazo de validade, advirto. De um lado, temos um casal no qual a esposa, Hannah (Lois Chimimba), começa a ficar extremamente preocupada com o The One, com receio de que seu marido, Mark (Erci Kofi), um dia encontre sua combinação perfeita por aí. Dessa forma, ela, às escondidas, tenta descobrir quem é compatível com seu esposo e deixa as coisas irem longe demais, a partir do momento em que decide além de conhecer a pessoa combinada, entrar na vida dela.
Do outro lado, temos o desenvolvimento da vida pessoal da policial responsável por investigar o assassinato de Ben (Amir El-Masry), Kate Saunders (Zoe Tapper). Assim como boa parte da população, ela também se submete ao banco de dados do The One e logo se apaixona por sua correspondência. Ela só não imaginava que sua match sofreria um grave acidente e esconderia sérios segredos. Preciso pontuar que esse arco poderia reservar plots interessantes, no entanto, o roteiro mais uma vez seguiu o caminho mais fácil e, por isso, perdeu boa parte do encanto.
Em suma, ainda que as tramas paralelas sejam mais interessantes do que a trama central, o desfecho delas é igualmente sem graça.
Entre as reflexões da série estão até onde a genética nos condiciona e prevalece sobre as interferências do meio que nos cerca. Uma combinação poderia simplesmente apagar uma romance de anos? Temos ainda de pano de fundo o clássico tema: os fins justificam os meios?
Existe gancho para a segunda temporada e ele é bem previsível, já que nem precisa ser um grande entendido de biologia básica pra ter a sacada exposta no episódio final da série. Mas se tenho vontade de continuar acompanhando o futuro de The One e dos milhares de casais que estão sendo combinados naquela cenário distópico? Não. É o tipo de cancelamento que não vai doer em boa parte do público.
Nota: 4,5
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