Quando a sátira se torna uma paródia de si mesma

Quatro temporadas depois e o status quo continua o mesmo. O mundo continua o mesmo. Contextos mudam, mas são reciclados, então dá no mesmo. A próxima temporada será a última de The Boys, e tenho certeza que os oito episódios finais serão uma corrida para o encerramento de tudo que foi apresentado (mas não propriamente desenvolvido) nas temporadas anteriores; como se fosse um gigantesco terceiro ato apressado que não sabe muito bem como terminar o que começou.

A cena do Hughie perdoando o Trem Bala no quinto episódio é o mais sintomático disso porque tenta quebrar essa natureza estática, mas falha miseravelmente, não em intenção mas em execução: curtos diálogos e tudo é resolvido e nos damos por satisfeitos. O conflito que começou a narrativa no primeiro episódio da série, o Hughie sendo nossa porta de entrada para o mundo dos rapazes, resolvido em uma troca de olhares anticlimatica. Não é um mundo no qual existem resoluções ou catarse.

Sim, Billy Butcher é um filho da puta hipócrita obcecado com sua cruzada supostamente justa de matar os supers pelo que eles fizeram com pessoas inocentes apesar do próprio não se importar se seus métodos machucam pessoas inocentes. Agora com a trama do vírus, isso é mais uma vez colocado como conflito como se alguma coisa tivesse mudado;

Capitão Pátria quer ser adorado (isso até ganha uma história de origem no episódio quatro) e é um caso de complexo de Édipo (falho, já que os roteiristas tem uma visão rasa vinda da psicologia pop), já explorada a exaustão na primeira temporada e transformada em piada na segunda; agora novamente tem a parada do leite materno e o Capitão Pátria ganha sua segunda Tempesta.

Leitinho de Mãe tem que se provar um bom pai e um bom líder para sua equipe. Francês tem que superar seu passado como assassino e seu medo de intimidade. Kimiko tem que superar seu passado como assassina na Luz Brilhante.

Entenderam? The Boys se prova uma série tautológica.

Tirando isso, cansei da “sátira” que a série apresenta do mundo (socialmente, politicamente), apesar da sátira sobre o estado contemporâneo do “entretenimento” ser menos pior; se querem uma sátira real vejam Succession da HBO. Eric Kripke e toda a sala de roteiristas de The Boys são míopes e não conseguem ver além de Republicanos x Democratas, Trump x qualquer fantoche que será o candidato liberal; na verdade não vêem além dessa guerra cultural que eles mesmo estão perdendo. 

Não importa insistir (de novo, tautologicamente) que o Capitão Pátria é um filho da puta, incels ainda vão amá-lo. É assim que a apropriação desses personagens funciona. Psicopata Americano critica os yuppies e odeia fervorosamente o Patrick Bateman. Isso é óbvio. Mas o personagem ainda será amado pelo tipinho que mencionei.

A vulgaridade e o humor cru e juvenil acabam por distrair mas são essência dessa sátira (a Espoleta como o Alex Jones mulher, a Vought como uma corporação composta por engravatados reacionários que quer ser vista como progressista, etc), e no final são a essência da série, e agora muitos estão espantados com a falta de tato na cena do abuso sexual do Hughie. A série já não sabe explorar muito bem a sexualidade quando não se trata de tokenização, só ver sua visão conservadora do BDSM e a desumanização de pessoas com parafilias como degenerados pura e simplesmente.

Acabei por pensar na série em todo seu panaroma ao invés de apenas o episódio. E esse sexto episódio para a temporada é também a prova de que os roteiristas estão perdidos. Estamos no final e só agora realmente introduzem o vírus. É um prelúdio pra última temporada (o que é brochante por si só, e já esperam diversas piadas com a pandemia) ou vão resolver isso no último episódio (como resolveram a Tempesta e o Soldier Boy). 

Isso sem contar na reviravolta burra que vemos do Billy Butcher e seu amigo Kessler. A reviravolta mais batida da cultura pop feita da forma mais capenga e irrisória que já vi.

Mas não se preocupem. Teremos mais cameos, mais análises profundas sobre os EUA contemporâneo, mais cenas do Capitão Pátria sendo amamentado, e mais pessoas ainda pensando que essa é uma série de prestígio. 

Espero que as cenas no V52 e sua sátira do Universo Cinematográfico da Marvel com o painel expondo os planos para as fases 7 a 19 tenham causado uma dissonância cognitiva no Kripke. Ele se lembra muito bem de Gen V, do derivado da série que se passará no México, em como a Amazon está transformando The Boys em uma franquia. Estão fazendo um negócio sujo, realmente.

Nota: 4

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