Se é isso que os fãs da saga querem como adaptação, talvez seja melhor se questionar até onde uma adaptação fiel mas sem qualquer intenção de fazer algo interessante é uma boa aposta.

Percy Jackson e os Olimpianos narra a vida do adolescente Percy Jackson que descobre ser um semideus, filho de Poseidon com uma humana. Percy e seus amigos vão a uma missão para evitar uma guerra entre os deuses Zeus, Poseidon e Hades.

Acho que é bem preciso falar que Percy Jackson é uma das maiores obras literárias voltadas para o público infantojuvenil já escritas em todos os tempos, rivalizando em popularidade com Harry Potter. Apesar da saga de livros de extremo sucesso de Rick Riordan terem conquistado tantos corações, ela chegou a receber uma adaptação em 2 filmes live-actions produzidos pela FOX que não agradaram nem um pouco as pessoas, pela sua falta de qualidade e fidelidade aos livros.

Com isso, a Disney se viu com uma nova galinha dos ovos de ouro na mão. Uma adaptação em formato de série para o serviço de streaming Disney+ logo recebeu sinal verde, com Jonathan E. Steinberg (Black Sails, The Old Man) e Riordan atuando como criadores, showrunners e principais roteiristas. Esse envolvimento forte de Riordan inclusive tranquilizou muito os fãs, já que ele esteve pouco envolvido nos filmes.

Bom, mesmo tendo minhas ressalvas, sempre fiquei curioso por ser fã do primeiro filme quando criança e amar tudo deste universo. Eventualmente a série veio a se materializar, mas ao ver os teasers e trailers, não tinha tido muito ânimo.

Preciso abordar também o que é um dos grandes motivos de sempre ter tido um pé atrás com a produção: Disney+. O serviço de streaming da Disney existe faz quase 5 anos e até o momento dá pra contar nos dedos de uma mão quantas produções originais são realmente boas e/ou vistosas. Parece que até suas grandes séries não conseguem gerar uma comoção ou provocar um sentimento de choque (da forma positiva) como séries da HBO, Netflix, Apple e Prime Video.

E isso causa um dos maiores problemas de Percy Jackson: A produção incongruente. Existem momentos em que fica nítido o alto investimento, mas outras cenas simples ou com alguns cenários de cgi recebem aquele trabalho pouco finalizado ou sem qualquer esmero. Nem quero falar da paleta de cores da série que se resume a cinza, cinza claro e cinza escuro.

Tem outra coisa bizarra que é a edição e formatação da série. Tem vários momentos em que tem umas transições entre cenas compostos de telas escuras por 2-3 segundos, coisa que é comum em séries antigas exibidas na TV linear (para se aplicar os comerciais nesses momentos). E é inconcebível o por que da duração tão curta dos episódios, que deveriam no minímo ter 

O design de produção é simplista demais e nada realmente impressiona. Até as armas, roupas e objetos que deveriam ser mágicos e interessantes são meio genéricos e sem vida. Pelo menos algumas das criaturas que aparecem são bem trabalhadas com seus visuais e efeitos (tirando todo o filtro e cenário cinza que as acompanha).

E a própria direção da série é algo sem qualquer inspiração ou característica que faça ela ser memorável. Os diretores James Bobin (Os Muppets, Dora e a Cidade Perdida), Jet Wilkinson (Demolidor, Warrior Nun) e Anders Engström (Taboo, See) também não sabem comandar cenas de ação, com cenas pouco inspiradas ou bem coreografadas.

Pelo que eu pesquisei, a série de fato é MUITO fiel aos livros de Riordan. Quase tudo do primeiro livro, “O Ladrão de Raios” é adaptado, deixando várias pistas e referências aos livros futuros. Isso pode ser considerado um ponto positivo em relação aos filmes antigos.

Isso me trouxe um questionamento: Será que Percy Jackson é realmente bom assim como os fãs lembram? Muitos leram na infância ou na adolescência e nutrem muito carinho pela obra. Mas vendo a série, percebi um grande vazio nos personagens, tirando é claro o trio principal. Tudo é fácil demais, nunca tem um risco ou consequências de verdade. Os perigos e medos que sempre tentam gerar não funcionam, e até a guerra dos deuses que é tão falada parece mais uma discussão de condomínio (que pode ser assustadora mesmo, mas aqui não é).

Já o elenco é talvez a coisa mais interessante de toda a série? Vamos falar do protagonista, que é vivido pelo ator Walker Scobell (O Projeto Adam, Esquadrão Secreto). O seu Percy é… estranho. Em alguns momentos gosto de sua atuação e ele sabe vender as cenas dramáticas ou de comédia, mas todo o resto é deslocado. Não me entendam mal, ele foi uma boa escolha, mas aqui é um daqueles casos onde a direção não sabe comandar o seu elenco, e isso é muito importante para atores jovens e novatos como ele.

Obviamente, Percy é acompanhado de seus amigos Grover e Annabeth, um sátiro e a filha da deusa Athena, interpretados por Aryan Simhadri (Doze é Demais, Spin) e Leah Sava Jeffries (Empire: Fama e Poder, Rel), respectivamente. Grover é carismático e serve mais como um alívio cômico, e mesmo não funcionando 100% das vezes, trás uma leveza necessária. Já Annabeth de Leah é de longe a melhor coisa da série. A atriz sofreu diversos ataques (por motivos que nem ouso mencionar de tão nojentos) e entregou a personagem mais interessante, forte e destemida. Uma personagem apaixonante que rouba todas as cenas em que está.

O resto do elenco é composto por uma mistura de atores veteranos como Lin Manuel Miranda (Hamilton, Em um Bairro de Nova York), Virginia Kull (Big Little Lies, Twin Peaks: O Retorno), Glynn Turman (Super 8, A Voz Suprema do Blues), Jason Mantzoukas (Invencível, The Good Place), Megan Mullally (Parks and Recreation, Artista do Desastre), e atores novos desconhecidos. De destaque mesmo, só a interpretação do incrível e saudoso Lance Reddick (John Wick, The Wire), que teve Zeus como um de seus últimos trabalhos em vida. Um trabalho forte que mostra como ele era um ator diferenciado e com presença de tela.

Posso acabar me queimando com muitos, mas acho que de verdade prefiro o primeiro filme a essa temporada. Ele pode mudar muitas coisas do livro e fazer decisões questionáveis a própria Annabeth no filme é quase um manequim, se não estivesse lá não mudaria nada), mas eles souberam transcrever coisas do livro com um visual , sendo tudo bem mais interessante e vivo.

A série tem pequenos momentos que mostram que existe um orçamento grande e o potencial de fazer tudo rolar. Aquelas criaturas da floresta no acampamento meio sangue, o cerberus nos portões do inferno, até mesmo algumas modernizações como o Ares falando do Twitter como um espaço de guerra. Se tivesse mais disso e menos filtro cinza e  um roteiro corrido, teríamos um banquete dos deuses.

A temporada termina estabelecendo Cronos e seus discípulos como os grandes antagonistas, e embora tenha um final relativamente feliz, deixa ganchos para a próxima temporada que irá adaptar “O Mar de Monstros”, o segundo livro da saga.

Mesmo estando oficialmente renovada, não sinto que tem muito espaço para “Percy Jackson” de fato alçar voo. A fanbase já se apaixonou pela série e o grande sucesso dela não deve dar incentivo para a Disney melhora-la ou fazer as mudanças necessárias. No fim, não é um desastre ou uma série que vai realmente se tornar algo lembrado ou querido por todos. Torço para estar errado, pois o potencial existe. 

Nota: 5.5

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