Filme sobre a lenda do reggae acaba sofrendo pelo escopo pouco ambicioso e aderência às convenções batidas de cinebiografias musicais

Um erro comum de muitas cinebiografias é a vontade de narrar a vida de seu protagonista do berço até o túmulo, o que por muitas vezes acaba comprometendo um todo coerente, carecendo de um arco temático real, entregando uma sucessão de eventos e cenas que, interessantes ou não, não ajudam o público a entender quem realmente foi aquela pessoa cuja vida está sendo retratada; no final um filme de duas horas acaba parecendo que tem três. Bob Marley: One Love não tem essa pretensão de mostrar a vida inteira do músico, escolhendo uma janela de tempo até que curta, focando em eventos que ocorreram de 1976 até 1978.

O filme começa com o cantor se preparando para o concerto Smile Jamaica enquanto o país se encontra em um brutal conflito armado e termina com o concerto One Love Peace Concert; claramente o roteiro estava mais interessado em analisar o impacto social do Marley do que contar toda sua trajetória musical. O filme conta com flashbacks que mostram um pouco da vida do Bob Marley antes da fama, de como os Wailers conseguiram uma gravadora pela primeira vez, do seu romance com a esposa Rita, mas o mote do filme fica definido pela vontade do Bob de mudar o mundo nessa jornada pacifista e espiritual. 

Isso acaba diminuindo alguns momentos que poderiam ter sido muito melhores, como a gravação do álbum Exodus, cenas em shows e concertos, que acabam sendo muito curtas. A própria canção One Love só toca nos créditos quando tem aquela obrigatória parte no final de toda cinebiografia musical na qual textos explicam o legado e influência de seu protagonista, além de mostrar o ano de sua morte; e claro, clipes de shows e entrevistas são mostradas.


E não é surpresa que várias das convenções e clichês do gênero são usadas e abusadas no filme. Em uma cena bastante engraçado no filme A Vida É Dura - A História de Dewey Cox (uma comédia bem mediana que parodia esses filmes biográficos sobre músicos), um personagem fala que o protagonista precisa pensar em toda sua vida antes de entrar em palco. Imagine minha surpresa ao ver isso ocorrer literalmente aqui. Toda vez que o Bob Marley ia entrar em um palco, ele antes tinha um flashback especifíco, que se repete durante o filme todo. 

Não esqueçam das cenas de discussão de relacionamento que parecem ser quase obrigatórias já que a execução é sempre a mesma. E para que o público não pense que esse filme é uma versão autorizada que encobre erros, temos as cenas mostrando que o Marley não foi o melhor marido possível às vezes e que ele também era humano e tinha crises de raiva. Claro, cenas assim servem para humanizar seu protagonista, não é preciso uma criação de mitos quando se trata de músicas; o problema dessas cenas é que elas soam falsas.

No fim, Bob Marley: One Love tem a ideia correta de não querer alongar sua trama mostrando toda a vida do cantor, mas o que poderia ser uma qualidade torna-se sua sina, o escopo não é minímo nem máximo, ele apenas não é aproveitado de forma certeira; acabamos saindo com um conhecimento maior do seu legado do que sobre sua pessoa.

Nota: 5

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