Cinebiografia de Claudinho e Buchecha pode até seguir uma receita básica, mas é uma grande homenagem à essa incrível dupla da música brasileira que não deve nada para cinebiografias americanas.

O Fórum Nerd foi convidado a conferir o filme em uma cabine de imprensa á convite da Manequim Filmes.

“Nosso Sonho” é uma cinebiografia de “Claudinho e Buchecha”, dupla de maior sucesso do funk melody nacional de todos os tempos e ícone máximo do gênero na música brasileira. A história de uma amizade que se transforma em força de superação e conquista. Um filme que mostra como o ritmo e a poesia da periferia conquistaram o Brasil. Uma história real repleta de fantasia. Um musical, emocionante e divertido, feito de drama e tragédias, mas também de humor, surpresas e redenção.

Nunca estive muito por dentro do mundo da música. É claro, sempre gostei de ouvir músicas desde pequeno, mas não me preocupava em saber quem eram os cantores ou compositores dessas músicas, sendo algo que nunca realmente despertou o meu interesse, diferentemente do cinema que eu sempre busquei saber quem eram os atores, diretores e equipe técnica por trás dos filmes e séries que via.

Portanto, nunca fui familiarizado com a história ou até mesmo músicas de Claudinho e Buchecha. Obviamente conhecia a dupla por nome e tinha ouvido algumas de suas músicas mais populares, já que eles eram a maior febre no Brasil nos anos 90 e começo dos anos 2000 (época em que eu nasci), e é inegável que eles tinham um talento nato para compor e performar músicas que eram contagiantes e sim muito boas.

Chegou o momento então da dupla (que acabou muito cedo por conta da morte trágica de Claudinho em um acidente de carro em 2002) ganhar uma cinebiografia comandada por Eduardo Albergaria (Happy Hour: Verdades e Consequências, Paysandú - 100 anos de payxão). E mesmo estando bem farto de cinebiografias de cantores ou grupos musicais e não ter nenhuma conexão emocional com a dupla, afirmo com um sorriso no rosto que “Nosso Sonho” foi uma grata surpresa do ano.

A primeira coisa que vale destacar é a qualidade da produção do filme, que tem um bom investimento e uma direção bem sólida de Albergaria. A fotografia é bem básica mas eleva o nível quando eles vão se apresentar em shows ou bailes funks, utilizando luzes diferentes que deixam a estética bem mais aprazível. Esse é um filme que prova como o cinema nacional tem muita qualidade sim quando tem o investimento certo e paixão envolvida, e entrega produções que não devem nada para filmes estrangeiros.

O filme segue a “receita de bolo” de quase toda cinebiografia no planeta mostrando desde a infância complicada do artista, o descobrimento do talento, ascensão, dificuldades no meio da carreira e um final triste mas feliz ao mesmo tempo. Mesmo não sendo necessariamente um grande defeito essa falta de ambição joga contra o filme, que não se esforça para criar algo único ou sair da casinha.

Porém o que vende mesmo o filme é a dupla principal interpretada magistralmente pelos atores Juan Paiva (M-8: Quando a Morte Socorre a Vida, Totalmente Demais) e Lucas Penteado (Barba, Cabelo e Bigode). Os dois tem uma química assustadora e um carisma sem fim, entregando duas interpretações dosadas de humor e drama. São dois achados e eu realmente espero que eles consigam mais papéis e tenham carreiras brilhantes no rumo da atuação.

O elenco de apoio é composto de nomes não conhecidos, com exceção de Nando Cunha (Salve Jorge, O Novelo), que interpreta (muito bem por sinal) o complicado e abusivo pai de Buchecha. Esse personagem é o que tem destaque tirando a dupla principal, e todo o arco dramático gerado por ele funciona de forma orgânica, embora eu não sei se o seu desfecho tenha sido totalmente merecido.

A trilha sonora original do filme é bem inexpressiva, e realmente só se escora nos momentos onde eles colocam as músicas de Claudinho e Buchecha na apresentação dos shows. Inclusive é muito maneiro ver todo o processo deles em desenvolver as músicas e conciliar com a vida e trabalho.

Mas se tem uma coisa nesse filme que me irritou profundamente e me tirou completamente da experiência foi uma determinada cena onde acontece uma tragédia (e isso é algo que eu reparei que acontece muito no cinema nacional). Eu destaquei muito como a produção e o elenco estavam de parabéns durante o filme todo, mas é inacreditável como tudo nessa cena descamba pro nível mais amador possível, com atuações caricatas e uma direção bizarra, sem falar na montagem cheia de cortes estranhos e totalmente fora do tom do que foi apresentado até agora. Pelo menos é apenas uma pequena cena que não dura nada, mas causa esse estranhamento.

Tirando isso, o que mais joga contra “Nosso Sonho” mesmo é a falta de ambição e talvez técnica para fazer algo especial. Podiam apostar numa edição mais ousada e frenética, uma fotografia mais interessante ou planos sequências mais dinâmicos. Mesmo assim a cinebiografia é muito superior a outras conhecidas como “Bohemian Rhapsody”, “Rocketman” e “Os Dois Filhos de Francisco”, mas a falta de estilo faz ele ficar abaixo de outras como “Elvis” e “Johnny & June”, que tem bem mais identidade e qualidade.

Um bom exemplo disso é o “final covarde” do filme. Em um determinado momento temos uma das cenas mais bonitas do filme onde Claudinho desce do palco  no meio do show e deixa Buchecha cantando sozinho, e fica na multidão. Eu estava preparado para um final catártico ao melhor estilo  “Aftersun”, um dos meus filmes favoritos dos últimos anos, com ele desaparecendo em meio a multidão, trazendo uma linda simbologia. Mas o filme optou por um final mais convencional e beeeem sem graça.

“Nosso Sonho” pode até seguir à risca todos os arquétipos de uma cinebiografia, mas consegue mesmo assim achar a sua identidade e brasilidade que o fazem se destacar em meio a tantas produções duvidosas dentro deste gênero. Mesmo estando saturado desse tipo de filme, foi uma excelente surpresa que conversa e agrada até aqueles que não são muito fãs ou familiarizados com a carreira de Claudinho e Buchecha, e de fato merece ser assistido tanto nos cinemas quanto nas residências dos espectadores.

Nota: 7

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