Minissérie do criador de Big Little Lies entrega um drama criminal objetivo e recheado de suspense.

Julgamentos são motivo de fascínio para boa parte dos espectadores sedentos por assistirem grandes embates entre defesa e promotoria, bem como grandes reviravoltas onde réus são inocentados, ou considerados culpados por seus crimes. Quando a acusação é um estupro, os sentimentos envolvidos costumam ser mais doloridos e os gatilhos se fazem presentes.

Não é de hoje que sabemos que para uma mulher denunciar um estupro não é simples. Facilmente de vítima, a mulher passa a ser culpabilizada, descredibilizada e os verdadeiros criminosos geralmente saem ilesos, uma vez que vivemos em uma sociedade machista e misógina, difícil de desconstruir.

É a partir dessa importante temática que a mais nova minissérie da Netflix, lançada no dia 15 de abril deste ano, se envereda.

Anatomia de um Escândalo é uma minissérie dramática britânica de seis episódios criada por David E. Kelley, grande nome por trás de sucessos como Big Little Lies e The Undoing, e Melissa James Gibson. Sua história é baseada no livro de mesmo nome escrito por Sarah Vaughan. 


Na trama, a notícia de que um importante deputado, aliado e amigo pessoal do primeiro ministro britânico, James Whitehouse (Rupert Friend), está tendo um caso com a sua assessora vaza para a imprensa. Sophie Whitehouse (Sienna Miller), sua esposa, terá que reunir forças pra lidar com as consequências desse escândalo, que se agrava quando uma denúncia de estupro vem à tona.


David E. Kelley sabe mesmo como contar histórias. Quem acompanha os trabalhos desse excelente produtor, perceberá que a pauta abuso/assédio sempre está presente, no entanto, com diferentes abordagens. Aqui a intenção não é tanto causar uma dúvida contínua no espectador com relação a existência ou não do crime, já que isso não demora a ser esclarecido. Fica evidente que o objetivo central é mostrar como o sistema é frágil, em qualquer parte do mundo, quando se trata de denúncias desse tipo e, em especial, o significado da palavra consentimento. Acredite, algo que era para ser óbvio, precisa ser constantemente pauta de debate, pois ainda existem pessoas que se veem acima da lei.

Apesar do primeiro episódio não empolgar tanto, a partir do segundo, o ritmo já é ditado e a narrativa se torna envolvente e bastante objetiva. O julgamento é mostrado quase que em sua integridade, começando com o depoimento da vítima, Olivia (Naomi Scotti, Aladdin), e terminando com o depoimento de James. É interessante notar que o ritmo de um júri britânico é menos espetaculoso que o americano. A promotora que representa a coroa, que seria como se fosse o Estado, Kate Woodcroft (Michelle Dockery, Em Defesa de Jacob) é uma personagem chave e responsável por uma das grandes reviravoltas da narrativa, e, por sua vez a advogada de defesa, Angela Regan (Josette Simon), é simplesmente brilhante no que se propõe.


Rupert Friend (Homeland) surge como uma ótima escolha para interpretar um homem da elite britânica, conservador e que aparenta ser um exímio esposo e pai de família. A cada episódio novas camadas do personagem são reveladas dando sentido ao contexto e nos permitindo criar percepcções precisas sobre o caso instaurado. Apesar de sua ótima atuação, não dá pra negar que quem rouba a cena é Sienna Miller.



A estrela de longas como Sniper Americano, assume o papel da esposa inicialmente disposta a tudo para apoiar seu marido, mesmo sabendo de sua infidelidade, mas que inicia uma espécie de autoanálise durante o processso, Em certo ponto, ela começa a revisitar seu passado  observar com um outro olhar as ações de seu marido, além de seu próprio comportamento. A atriz em entrevista para revista britânica Elle admitiu que interpretar uma esposa traída fez com que ela revisitasse lembranças de sua experiência pessoal em seu antigo relacionamento com o ator Jude Law, quando ele a traiu com a babá dos filhos dele, frutos de um relacionamento prévio. Sem dúvida, é tangível o quanto a atriz esteve imersa em seu papel entregando assim um resultado mais realista, sem parecer dramalhão.

Se há algo que não funciona tão bem na minissérie são os flashbacks. Não é dada a verdadeira importância para essa parte tão vital na construção da história. As cenas são muitas vezes apressadas, desorganizadas e em várias situações o estilo de filmagem passa aquela sensação estroboscópica que é definitivamente desnecessária e exaustiva. 

O vai e vem das câmeras, seus giros e duplicações não entregam um resultado positivo, ao contrário, incomodam. Existem também algumas metáforas aqui que não casam bem, como por exemplo quando o personagem de James Whitehouse é lançado para trás "simbolicamente" como se representasse o baque que ele acabara de sofrer. É dramático demais e a cena não fica orgânica. Aqui a melhor pedida seria ficar no famoso menos é mais.

Apesar de um plot twist interessante, não espere a reinvenção da roda aqui. A narrativa é previsível, mas ainda assim é bem contada e prende a atenção. Portanto, pra quem é fã de dramas criminais, a minissérie sem dúvida é uma boa pedida.

Nota: 7,5

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