Pode-se dizer que A Crônica Francesa eleva a assinatura do diretor ao seu ápice. Nos 107 minutos de duração, Wes Anderson estiliza seu filme ao máximo, não podendo superando até mesmo o engenhoso O Grande Hotel Budapeste, que antes, ocupava o posto do filme com a marca mais nítida do diretor.
Como em toda sua filmografia, a história se
desenrola em três atos bem distintos, mas desta vez ele quebra a estruturação
convencional de começo, meio e fim; tendo um breve início, um longo interlúdio
e um final pontual.
O intuito da obra é justamente retratar
visualmente as páginas do The French Dispatch, jornal americano que reside em
uma cidade fictícia francesa. Mas esta premissa, acaba por gerar os problemas
mais graves do filme, já que, por contar quatro histórias diferentes, assim que
passamos a nos interessar pelos personagens retratados, a narrativa altera-se
para outra completamente distinta, deixando um gostinho de “quero mais”.
Esse elemento faz com que o espectador possa se
perder entre as histórias, tentando estabelecer o mínimo de conexão entre elas,
que no final acaba por ser a localidade em que se passam e a relação empresarial
dos autores, já que todos são empregados do jornal comandado por Arthur
Howitzer (Bill Murray).
O filme em nenhum momento torna-se entediante, já
que o ritmo é acelerado como em todos os filmes de Wes Anderson. Mas esse
dinamismo faz com que se demore a entender o que está ocorrendo na história,
por conta de tudo ser introduzido muito depressa, dificultando o entendimento
da motivação de cada personagem.
Apesar disso, toda a experiência é um deleite
para os olhos, fazendo que o filme seja muito aprazível de se assistir. Todas
as assinaturas do diretor estão presentes: os takes simétricos e planificados;
uma história bizarra mais crível; cores fortes e cenários vivos.
Cores essas que são parte importante na
condução da história, já que o filme alterna entre o preto e branco e o
policromático, ditando assim o passado e o presente; a história ocorrida e a descrição
dos autores, que vivenciaram a maior parte dos eventos
Cada uma delas tem um estilo bem único de ser
contada. Iniciando pela breve, mas carismática retratação do passado e presente
de cidade francesa, feita por Herbert Sazerac (Owen Wilson), seu propósito
é contextualizar o expectador no que está por vir, servindo de introdução. Depois
seguimos abruptamente para a história do pintor Moses Rosenthaler (Benicio
Del Toro) sendo poética e romântica, trazendo reflexões sobre a arte pura e
sua perversão diante do comercial. Já a
crônica do jovem idealista Zeffirelli (Timothée
Chalamet) tem um teor revolucionário, que relembra o confronto final
de Os Miseráveis de Vitor Hugo. Por fim, a odisseia culinária de Roebuck Wright
(Jeffrey Wright) evoca o clima "noir" quando retratando o passado, e o vintage no
presente. Nessa última em especial, Wes Anderson chega a acrescentar uma animação,
que de nenhuma forma se torna dissonante com o resto da obra, sendo uma adição
bem divertida, combinando com o humor caricato e satírico, marca do diretor. Onde
personagens sempre se encontram em situações cômicas, mas agem com naturalidade,
passando credibilidade mesmo diante de absurdos.
O filme possui uma musicalidade que se destaca
na coreografia e expressões dos atores. Todas as cenas são construídas de forma
que seguem um BPM (batimentos por segundo), assim como em uma música, onde
sempre um gesto proemine ou um acontecimento na cena, alinham-se perfeitamente
com a batida. Em algumas cenas, principalmente em planos mais aberto da cidade,
cada elemento pode se encontrar em um BPM diferente. Vale ressaltar que a
trilha sonora não evidencia isso, pois ela não está na mesma batida que a
coreografia, mas se testado com um metrônomo, poderá constatar que toda
composição está em ritmo.
Deve-se parabenizar os atores nesse aspecto, já
que em nenhum momento, eles perdem a naturalidade diante dessa decisão
criativa, sendo tão imperceptível, que apenas é subconscientemente sentida a
sensação de que todo na cena está mais harmoniosa do que o comum.
Tratando das atuações, todos os atores estão
bem, mas pelas decisões criativas do enredo, infelizmente, as grandes estrelas
são mal aproveitadas. O filme conta com um elenco dos sonhos, isso faz com que
coadjuvantes que não chegam a ter um minuto de tela, tenham rostos familiares.
Não há destaque, mas pela liberdade que o
diretor dá aos atores na interpretação, todos cumprem seu papel, entregando exatamente
o que se espera e em nenhum momento, você questiona da vivacidade dos
personagens.
O filme pode ser o ápice de seu estilo, mas
infelizmente em detrimento da homenagem que deseja fazer ao jornalismo de
vanguarda, inspirado na paixão do diretor pela The New Yorker, peca em aspectos
básicos, que não são proeminentes em suas outras obras.
Apesar de não estar entre os melhores que Wes
Anderson já fez, é um filme divertido de se assistir, que definitivamente vale
seu tempo. Mas deve-se ver com a mente aberta, pois não é uma história
convencional nem mesmo para os amantes dos filmes do diretor. Para quem tiver se interessado, o filme se encontra disponível no Stars+.
Nota: 7,0
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