Emocionante, carismática e com personalidade, adaptação do quadrinho de Jeff Lemire mostra que não é preciso ser totalmente fiel à obra original para ser uma boa adaptação.

Há dez anos, "O Flagelo" causou estragos no mundo e levou ao misterioso surgimento de híbridos: bebês nascidos parte humanos, parte animais. Sem saber se os híbridos são a causa ou o resultado do vírus, muitos humanos os temem e caçam. Após uma década vivendo com segurança em sua casa isolada na floresta, Gus (Christian Convery), um menino-cervo acolhido, inesperadamente faz amizade com um viajante solitário chamado Jepperd (Nonso Anozie). Juntos, eles partem em uma aventura extraordinária pelas ruínas da América em busca de respostas sobre as origens de Gus, o passado de Jepperd e o verdadeiro significado de um lar.

Adaptação do quadrinho homônimo (que você pode ler a nossa crítica clicando aqui) do aclamado quadrinista Jeff Lemire (Cavaleiro da Lua, Black Hammer), a série foi anunciada em 2018, como uma produção do serviço de streaming Hulu e produzida pela produtora de Robert Downey Jr (Homem de Ferro, Zodíaco) e sua esposa, em parceria com a Warner Bros. Television. Com roteiros de Jim Mickle (Sombra Lunar, Julho Sangrento), Beth Schwartz (Arrow, Legends of Tomorrow) e Christina Ham (Eles, O Mundo Sombrio de Sabrina) e direção de Mickle, Toa Fraser (Demolidor, No. 2) e Robyn Grace (Orange and Lemons), a série teve problemas de produção durante as filmagens de seu piloto, fazendo com que a Hulu vendesse os direitos para a Netflix, que continuou a produção e filmagens em 2020.

Logo de cara, a primeira coisa que chamou a atenção de todos ao assistir os trailers e materiais promocionais da série é a drástica mudança de tom da série para os quadrinhos. A série optou por uma abordagem mais “fofa” e leve, enquanto os quadrinhos são violentos e abordam temas pesados. Contudo, a adaptação ainda mantém as principais características dos quadrinhos e a essência que fez a obra de Lemire ter conquistado uma legião de fãs ao redor do mundo.

O elenco faz um ótimo trabalho em dar vida a esses personagens, com destaque para Christian Convery (Venom) e Nonso Anozie (Game of Thrones), intérpretes de Gus e Jepperd respectivamente. Gus se torna um garoto mais aventureiro e carismático, diferente do quadrinho que é mais quieto e assustado. Já Jepperd tem grandes mudanças, tanto em sua história quanto em sua personalidade. Seu passado nos esportes foi mantido, mas a série também suavizou sua personalidade e o tornou um homem mais calmo e compreensivo. Ambos os atores fazem ótimos trabalhos na caracterização dos personagens, com um mérito maior para Covery, já que é difícil achar atores mirins tão carismáticos.

O resto do elenco é competente e operante, com destaques para Will Forte (Nebraska) interpretando o misterioso pai de Gus, Adeel Akhtar (Enola Holmes) como Dr Singh, Stefania LaVie Owen (Krampus: O Terror do Natal) como Ursa, Neil Sandilands (The Americans) como o vilão Steven Abbot  e James Brolin (Traffic: Ninguém Sai Limpo), que serve como o narrador da série.

A maior surpresa no entanto foi a produção e o visual dado para a série. O design de produção da série é fantástico, com excelentes efeitos práticos e paisagens lindas. Grande parte da série foi gravada na Nova Zelândia, justificando as extensas florestas e cenários naturais, que também casa com a proposta da série e temática envolvendo a “natureza se vingando da humanidade”.

direção e fotografia da série também são gratas surpresas. O grande destaque fica por conta do diretor principal, Jim Mickle, que mesmo não inovando consegue construir boas cenas com ângulos de câmera interessantes e montagens interessantes, fazendo com que a série fique visualmente chamativa e cativante. A série está pau a pau com outras produções originais da Netflix como “Sex Education” e “Desventuras em Série”, que também possuem um visual chamativo e direção inspirada.

Algumas tramas são estendidas sem necessidade causando um inchaço na trama, principalmente o núcleo do Dr Singh e de Aimee (Dania Ramirez). Os núcleos tem ideias interessantes mas são alongados demais, não adicionando muito para a narrativa u trama da série.

Entrando em uma discussão maior sobre as diferenças, o arco mais alterado e “maltratado” pela série foi o de Jepperd. Nos quadrinhos, o personagem tem uma história trágica envolvendo sua esposa e seu filho, e embora a série mantenha de maneira diferente o seu passado, altera completamente alguns eventos e tirando os grandes conflitos do personagem. Essa mudança embora pareça insignificante, tira o grande arco de redenção de Jepperd que vemos nos quadrinhos, gerando diversos momentos emocionantes e que ajuda na construção tanto do personagem quanto de seu relacionamento com Gus.

O episódio final da série termina exatamente no fim do primeiro arco das hqs (mais precisamente na edição 5), onde temos Gus capturado e se encontrando com outros híbridos. Embora a construção da história até esse momento tenha sido bem diferente dos quadrinhos, o final deixa um excelente gancho para uma futura temporada, terminando com uma bela cena reconfortante e esperançosa.

“Sweet Tooth” é uma adaptação que subverte e muda muitos elementos das hqs. Mas mesmo assim, mantém a essência da obra e apresenta um universo mais esperançoso e rico em detalhes, sabendo balancear os temas pesados dos quadrinhos com o momento em que vivemos hoje com a pandemia. Visualmente bem feita e com um ótimo elenco, a série pode não ser totalmente fiel aos quadrinhos, mas com certeza vai agradar os fãs da obra original e novos espectadores que estão atrás de uma linda aventura com muito coração.

Nota: 8.

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