"A Vida Depois" aborda com coerência o estresse pós-traumático e lança luz no debate da pauta armamentista.

O transtorno de estresse pós-traumático (TSPT)  é uma condição desencadeada a partir da vivência de um trauma profundo. Esse distúrbio causa além de sofrimento, uma série de prejuízos ao indivíduo tanto em suas relações sociais quanto com o meio em que vive. 

O assunto já foi retratado no cinema inúmeras vezes, como por exemplo no sucesso Sniper Americano, no qual acompanhamos a história de um veterano de guerra, e em O Quarto de Jack, cuja narrativa gira em torno de uma família que passou anos mantida em cativeiro. Dado o leque de possibilidades da temática, a única certeza que temos, a cada nova abordagem, é a garantia de uma enxurrada de emoções.

Na trama da crítica de hoje o evento que cria gatilho para o TSPT é um atentado em uma escola de ensino médio. Infelizmente, um tipo de tragédia que não é tão incomum nos Estados Unidos.

A Vida Depois (The Fallout) é um drama estadunidense escrito e dirigido por Megan Park. Esse filme marca a estreia de Park na direção, ela que também é atriz e cantora e ficou conhecida pelo papel como Grace Bowman na série de televisão The Secret Life of the American Teenager.


O longa estreou mundialmente na South by Southwest em 17 de março de 2021 e faturou três prêmios. Mais tarde, no dia 27 de janeiro de 2022, ele chegou ao catálogo da HBO Max.

Na história conhecemos Vada (Jenna Ortega), estudante do ensino médio que, após presenciar um atentado promovido por um atirador em sua escola, passa a sofrer os impactos emocionais do ocorrido em sua vida. 

É importante destacar que o filme não é sobre o atentado em si, mas sim suas consequências. Tendo isso em vista, Park faz uma escolha inteligente ao abordar o ataque logo em seu primeiro ato, e a partir de um ângulo interessante, que consegue transmitir de forma bem sucedida o terror do acontecimento.

A cena do banheiro é simples e genial ao mesmo tempo. A tensão é tangível e imediatamente conseguimos nos conectar e nos sensibilizar com os personagens de Vada, Mia (Maddie Ziegler) e Quinton (Niles Fitch). Fica o alerta de gatilho, pois mesmo mostrando pouco, as sensações são muito bem exploradas e podem fragilizar o público.

A partir daí o filme faz juz ao seu nome. Acompanhamos uma nova Vada, bem diferente da apresentada no ato inicial. E é na companhia de Mia, estudante que ela conheceu durante o episódio com o atirador, que Vada consegue encontrar um espaço seguro em meio ao turbilhão de sentimentos. Assistimos aos altos e baixos e complexidades do distúrbio e como um simples barulho pode ser um gatilho emocional potente. 

A transição de comportamento de Vada é notória e somente uma atuação segura e poderosa como a de Jenna Ortega poderia garantir que de fato pudéssemos sentir o quão frágil e vazios aqueles estudantes se sentiram após o ocorrido. Guardem o nome dessa jovem atriz, pois ela tem um potencial incrível e provavelmente vai longe em Hollywood.


Maddie Ziegler (Amor, Sublime Amor) também se sai muito bem e entrega uma personagem de personalidade oposta a de Vada, que encontra na jovem suporte, uma vez que não possui a família tão presente nesse momento que é tão delicado.

A Vida Depois aproveita o espaço para conscientizar sobre a pauta armamentista, já que nos Estados Unidos há muito tempo existe uma parte da população que alerta sobre a necessidade de se criarem leis mais rígidas quanto a comercialização de armas de fogo e, no entanto, poucos avanços são feitos.

O longa também aprofunda reflexões sobre o tempo e a forma de se processar eventos traumáticos, destacando que as pessoas são diferentes, e por isso experinciam um mesmo evento de maneiras diferentes. Shailene Woodlye (Big Little Lies) interpreta a psicóloga de Vada, Anna, e não dá pra esconder a frustração de ver uma atriz com todo esse potencial ser tão subutilizada. A terapia na vida de Vada, assim como a personagem de Woodlye, poderiam ter sido mais exploradas, já que isso é um ponto crucial no tratamento do transtorno.

O eixo da família de Vada é lindamente dirigido. As relações além de soarem verdadeiras, emocionam por sua simplicidade. A cena entre as irmãs no ato final é uma das mais tocantes e vulneráveis. Um acerto que faz a diferença e dá personalidade à trama. 

A Vida Depois acerta na abordagem e entrega um filme sensível e, ao mesmo tempo, intenso. A lição que fica é que algumas coisas nunca desaparecem, porém existem meios de aprendermos a lidar com elas.


 
Nota: 8,0


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