Histórias de faroeste sobre cowboys vivendo com seus cavalos no Velho Oeste dos Estados Unidos sempre foi amplamente explorado nos cinemas e televisão, desde sua popularização nos anos 1930. E esse tema está tão agregado à cultura dos norte-americanos, que se tornou um estilo de vida entre algumas pessoas, atualmente vivendo em pequenas comunidades de algumas cidades.
O
filme “Alma de Cowboy” explora um pouco sobre esse estilo de vida, de forma
muito bonita, baseado em uma história real sobre um grupo de cowboys negros que
mora em uma comunidade no norte da Filadélfia. O drama em questão é inspirado,
mais especificamente, na história real dos Estábulos da Rua Fletcher da
Filadélfia.
Na trama, Cole (Caleb McLaughlin, de “Stranger Things”, 2016 – presente), um adolescente rebelde de 15 anos de Detroit, é levado por sua mãe até a Filadélfia, após entrar em brigas na escola, e deixado na porta da casa do ausente pai, Harp (Idris Elba, de “Vingança & Castigo”, 2021), para passar a temporada de verão. Durante esse tempo, Cole entra em choque com a cultura local da comunidade que seu pai vive, mas, aos poucos, começa a vivenciar o estilo de vida dos cowboys urbanos da cidade que existe há mais de 100 anos, proporcionando um refúgio seguro para o bairro, apesar da pobreza e violência.
Baseado
no livro “Ghetto Cowboy”, de Greg Neri, “Alma de Cowboy” é o primeiro
filme dirigido por Ricky Staub, que também assina o roteiro, juntamente com Dan
Walser. Staub surpreende em sua estreia ao mostrar a cultura moderna baseada em
uma história real de uma comunidade de cowboys negros de Filadélfia, que segue um
estilo de vida que está enraizada de forma intrínseca há anos, lutando
diariamente contra a violência, racismo, preconceito e desemprego, bem como
outros tipos de problemas, tais como as drogas. Além de se organizarem entre
eles para lutarem contra esses problemas sociais, o grupo se mantém unido para
se proteger e para manter uma tradição que tanto prezam e amam viver.
Ser um cowboy do asfalto, hoje em dia, é uma tarefa árdua e, diariamente, tem suas complicações ante ao crescente e desenfreado desenvolvimento urbano, que empurra e esmaga cada vez mais os grupos que vivem esse estilo de vida para os cantos das cidades – senão para fora delas – e que devem lutar, com muito suor e labor, contra todas as questões sociais que hostilizam essas comunidades de forma esmagadora, haja vista que essas pessoas vivem constantemente na angústia de perderem seu espaço na sociedade; justifica-se, então, a forte união entre as pessoas dessas comunidades, que se protegem e ensinam uns aos outros. E Staub consegue transmitir essa mensagem de forma brilhante.
Esse
forte sentimento de união e colaboração é bem explorada como gancho do filme em
tela assim que Cole passa a morar na comunidade em questão e começa a trabalhar
nos estábulos, sendo instruído e ensinado pelas pessoas que lá moram. Com o
tempo, Cole aprende não só como fazer o serviço que precisa ser realizado, mas,
também, passa a vivenciar aquele estilo de vida que todos batalham a todo custo
para continuar mantendo.
Com isso, Cole começa a entender, mesmo que depois de muito custo, a árdua tarefa daquela comunidade de continuar lutando por uma cultura e por viver um estilo de vida que é marginalizada gradualmente pela crescente expansão do território urbano, que os vai empurrando para os cantos, conforme a cidade vai crescendo. Percebe-se, então, que o personagem mirim de Stranger Things passa por uma jornada de amadurecimento. E esse processo é um pouco lento, haja vista que Cole, no começo do filme, era um adolescente bem rebelde que não queria estar naquele lugar. Essa trajetória necessita de um certo tempo para amadurecer, que não ocorre da noite para o dia – o que justifica a forma como a narrativa de “Alma de Cowboy” se procede, sem pressa e da forma mais natural possível.
Essa
trajetória de amadurecimento, crescimento pessoal, aprendizado e aceitação é
bem explorada não só do personagem ao ser inserido naquela comunidade, mas,
também, entre Cole e seu pai. Tendo sido um pai ausente, Harp encontra
dificuldades em se reaproximar de Cole, e vice versa; problema este que Harp
tenta resolver ao mostrar a Cole o estilo de vida que ele vive e como as
tarefas do cotidiano naquela comunidade são resolvidas, bem como os problemas
que o pessoal de lá enfrenta. À medida que Cole vai aceitando seu novo lugar naquele
mundo, pai e filho começam a se esforçar para se reaproximarem outra vez. Isso
é um processo natural que também demora um certo tempo para se ajustar; e é
outro ponto positivo construído pela forma como a narrativa do filme em tela
trabalha. Ou seja, sem pressa. E isso é bem diferente de ser lento e arrastado.
Ricky Staub usa a premissa de um relacionamento desastroso entre um pai e um filho, que tentam se reaproximar e reatar laços familiares, para contar uma belíssima história real sobre uma comunidade que luta a todo custo para preservar seu estilo de vida onde cowboys modernos enfrentam dificuldades cotidianos em centros urbanos. Pode-se perceber uma certa quantidade de clichês no longa em questão, mas isso não ofusca e nem atrapalha a mensagem geral de “Alma de Cowboy”, que soube transmitir, de forma coerente e satisfatória, a história de uma comunidade que ama viver e preservar aquela cultura local, além de continuar transmitindo-a a seus descendentes como um legado, mesmo que, atualmente, venha enfrentando certas dificuldades.
“Alma
de Cowboy” é um filme muito bonito de se ver, que chama a atenção pela
excelente atuação de seus atores, igualmente ótimos, e principalmente, por ser
um filme com uma proposta narrativa até bem simples, mas que entrega, de forma
brilhante, uma história real sobre uma comunidade unida, perseverante e que
está disposta a lutar para preservar sua bagagem cultural, assim como continuar
vivendo seu estilo de vida tradicional de cowboys, que ultrapassa a fronteira
de limites urbanos e que se esforça para honrar uma história que merece ser
vivida por aqueles que ainda amam viver assim. Por fim, vale destacar que o
diretor Staub convidou alguns dos cowboys de verdade da comunidade para
participarem do elenco de “Alma de Cowboy”.
“Alma de Cowboy” está disponível na Netflix desde o dia 2 de abril de 2021.
Nota: 8.5
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