"Imperdoável" narra as dificuldades da reinserção social de uma ex-presidiária e conta com atuações brilhantes de Sandra Bullock e Viola Davis.

A crítica de hoje se inicia com o seguinte questionamento: qual o objetivo do sistema prisional? Por via de regra, ele deveria buscar reintegrar os condenados à sociedade após cumprimento de pena, mas não é isso que vemos em países emergentes e, até mesmo em países desenvolvidos como os Estados Unidos. Mesmo em algumas potências, o sistema falha e muitas vezes se torna apenas um depósito de pessoas.

Debatendo tais falhas no sistema carcerário e conduzindo uma reflexão sobre valores, Imperdoável teve sua estreia na Netflix no dia 25 de novembro e conta com duas poderosas estrelas de Hollywood em seu elenco, as duas ganhadoras do Oscar, Sandra Bullock (Um Sonho Possível) e Viola Davis (Um Limite entre Nós).

Imperdoável (The Unforgivable) é um drama escrito por Peter Craig, Hillary Seitz e Courtenay Miles, baseado na minissérie britânica de Sally Wainwright, de 2009, Unforgiven. Peter Craig é o nome por trás de Jogos Vorazes: A Esperança e de dois filmes muito aguardados para 2022, The Batman, em parceria com Matt Reeves, e Top Gun: Maverick. A direção do longa é assinada por Nora Fingscheidt.

O filme narra a história de Ruth Slater que é solta após cumprir uma pena de 20 anos por homicídio. Durante o cumprimento de sua pena ela escreveu centenas de cartas para sua irmã mais nova, Katie (Aisling Franciosi), sem obter resposta, no entanto. Agora ela está disposta a encontrá-la e retomar contato. Isso não será fácil, pois Ruth logo perceberá que a vida de uma ex-presidiária é repleta de dificuldades. Entre elas conseguir emprego e manter convívio social, já que como o próprio filme mostra, a sociedade não perdoa nem mesmo aqueles que cumprem sua dívida para com o Estado.

A forma do filme é bem previsível. Seguimos  passo a passo o dia-a-dia de Ruth desde sua saída do presídio e acompanhamento por seu agente de condicional, Vincent (Rob Morgan), até sua busca por Katie. Somos expostos à precariedade dos alojamentos disponbilizados para abrigar as ex-detentas e vemos como muitos empregadores se recusam a oferecer vagas, mesmo quando há qualificação, em razão do estigma carregado por elas. 

O primeiro terço da trama é arrastado, com uma trilha sonora sem novidades e monótona, o que pode fazer com que alguns desistam do filme. Enquanto a trama se desenrola, inúmeros flashbacks são inseridos de modo a nos mostrar pouco a pouco como teriam ocorrido os eventos que conduziram ao assassinato que levou à condenação de Ruth. Alguns são um tanto quanto repetitivos e desnecessários, em contrapartida, os que são relevantes constroem com sucesso o nosso vínculo com a protagonista da história. Logo, aguente firme, pois a segunda metade do longa sustenta plots interessantes, uma crescente considerável e uma incrível reviravolta.

Sandra Bullock entrega uma personagem enrigecida pelo tempo na prisão e com cicatrizes interiores. Ela consegue transmitir com seu semblante as marcas de duas décadas difíceis e repletas de frustrações que se intensificam fora da prisão, no contato com o desprezo e discriminação por boa parte da sociedade. Uma excelente atuação e que ajuda bastante a validar a narrativa de Imperdoável.

Viola Davis interpreta Liz Ingram, atual moradora da residência que antes era da família Slater e esposa do advogado que se compadece com a situação de Ruth. Apesar do pouco tempo de tela dedicado a essa personagem, Viola faz aqui o que fez no filme Dúvida, que lhe rendeu a sua primeira indicação ao Oscar. Em uma de suas raras aparicões, ela entrega a melhor cena do filme ao lado de Sandra Bullock, onde o principal plot é revelado, com muita emoção. Preparem seus lencinhos. Ainda assim, é importante dizer que a subutilização de Viola incomoda. Em especial porque seu plot insita o debate sobre os privilégios da mulher branca no sistema carcerário, mas acaba ficando apenas em menção e não se aprofunda, ou seja, um total desperdício.

Entre os outros núcleos de personagens do longametragem, temos Blake (Jon Bernthal, O Justiceiro), que é um dos primeiros contatos sociais de Ruth. A relação dele com a ex-presidiária funciona muito bem e mostra com eficácia todas as dificuldades e traumas envolvidos na retomada do contato com as pessoas. O rancor e a vingança são explorados através dos irmãos Whelan, filhos da vítima do longa. A trama tenta mostrar a relação conturbada em suas famílias e os vestígios de crescerem às sombras de uma perda tão brutal. Temos ainda o núcleo familiar de Katie, irmã caçula de Ruth, que é bem sucedido ao mostrar os traumas carregados pela jovem decorrentes do assassinato, bem como a super proteção por parte dos pais adotivos.

Ainda que com vacilos estruturais, não dá pra negar que o Imperdoável consegue servir no quesito tensão. Seu ato final, por mais clichê que seja, é bem sucedido na tarefa de nos fazer torcer pela relação de Ruth e sua irmã. O desfecho agrada e emociona. E como não, com um elenco tão poderoso? Afinal de contas, quem disse que um bom clichê não é bem-vindo?


Nota: 8,0

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