Entre erros e acertos, "Radioactive" consegue inspirar ao narrar a vida da primeira mulher ganhadora do prêmio Nobel da química, Marie Curie.

A crítica de hoje tem um gostinho diferente. É muito especial quando a gente escreve algo que de fato significa algo em nossa vida.

O filme de hoje traz uma história que eu conto todos os anos para os meus alunos na disciplina de Ciências (a pessoa que vos escreve é professora) a fim de motivá-los, em especial as meninas, haja vista que o caminho para nós mulheres na ciência é muito mais árduo. Por sorte, esse caminho foi aberto há muitos anos por uma mulher incrível chamada Marie Curie. Fiquem tranquilos que não deixarei a emoção falar mais alto e minha crítica permanecerá imparcial, contudo eu não poderia deixar de dizer que ainda assim existe uma relação afetiva com esse longa.

Radioactive é um filme britânico biográfico sobre a primeira mulher ganhadora do prêmio Nobel da química, pela descoberta de dois elementos, o Rádio e o Polônio, Marie Curie. A direção é assinada por Marjane Satrapi e teve sua estreia em 2019. O filme chegou ao Netflix no dia 15 de abril deste ano.

A história narra a vida de Marie desde quando ela ainda era uma mulher solteira que respondia pelo nome de Maria Skłodowska. Vivendo no final do século XIX, Marie era uma mulher de origem polonesa brilhante que mantinha suas pesquisas na Universidade de Sorbonne, em Paris. Por ser mulher, no entanto, sua vida não era nada fácil. Além das dificuldades normais em suas pesquisas e experimentos, ela ainda tinha que conviver com os inúmeros obstáculos impostos pelos regentes da universidade que obviamente eram todos homens.

Assim que conhece Pierre Curie, homem cuja visão era bem a frente do seu tempo, os dois começam a trabalhar juntos no laboratório cedido pelo rapaz e um relacionamento amoroso e verdadeiro nasce. A partir daí acompanhamos a vida de descobertas científicas do casal, as consequências da radioatividade na saúde deles, até a morte de ambos.

Rosamund Pike interpreta a protagonista, que é uma mulher excêntrica e egocêntrica. As dificuldades de ser mulher e alcançar um lugar de destaque em meio a tantos obstáculos quase intransponíveis obviamente criou uma camada rígida em sua personalidade e Rosamund consegue apresentar isso muito bem e na medida. Sam Riley dá vida a Pierre Curie, um homem que, em outra situação, eu diria ser irreal. Como é uma biografia, eu não posso afirmar, mas apostaria que isso faz de certa forma parte da liberdade criativa usada na película. Chega a ser pouco crível a existência de um homem tão desconstruído naquele século, ao mesmo tempo, conforta a alma saber que Marie esteve tão bem acompanhada, caso seja verdade. Sam tem uma interpretação ok, mas nada que chegue a impressionar.

O grande problema do filme é o roteiro em si. A vida de Marie Curie é extremamente interessante, no entanto, a forma como foi abordada não é fluida. É possível sentir o atropelamento dos fatos para tentar se abordar um maior tempo de vida da cientista e dessa forma a naturalidade é perdida e o vínculo com o espectador não é constituído. Logo, as relações entre os personagens ficam próximas ao raso e existe uma dificuldade de se emocionar, apesar do esforço.

O filme tem um cunho pedagógico e usa parte do seu tempo para ensinar a química por trás dos experimentos de Marie e Pierre Curie. Isso se faz necessário e fica contextualizado, porém a forma como é feita é um tanto quanto artística, que fica parecendo em alguns momentos infantilizada.

Apesar de algumas falhas significativas, o filme contém acertos. O filme avança em diferentes eventos que repercutem as consequências negativas das descobertas dos Curie, tais como o atentado a Hiroshima e o acidente em Chernobyl. Tem uma cena de um teste de bomba atômica realizado pelos americanos que mostra o quanto a radioatividade pode ter consequências catastróficas. Ao mesmo tempo, Radioactive se empenha em enfatizar o uso positivo das descobertas da cientista, mostrando desde o tratamento radioterápico contra câncer, ao raio X, que foi algo fundamental na Primeira Guerra Mundial.

Outra adição importante, pena que breve, é a participação Anya Taylor-Joy como a filha mais velha de Marie, Irene. A atriz dá um show ao interpretar a jovem Irene, com uma personalidade forte tal como a mãe e, apesar do pouco tempo de tela, faz uma dupla assertiva com Rosamund, promovendo uns dos poucos momentos que emocionam genuinamente durante o filme. Ouso dizer que se essa parte da vida das duas fosse mais abordada, o filme teria rendido mais momentos marcantes.

Não há como negar que exemplos de mulheres como Marie Curie inspiram, dão esperança e motivam. Ainda hoje, mais de um século depois, continuamos no enfrentamento de uma sociedade machista e na luta contra as dificuldades de valorização no ambiente de trabalho sexista. O objetivo é que cada vez mais surjam "Marie Curies" e que, assim como ela, não desistamos e usemos o saber como ferramenta para ajudar as pessoas, não destruí-las.

Eu recomendo o filme por tudo que ele representa, ainda que não dê pra considerá-lo uma grande obra cinematográfica. Ele fica ainda como uma opção legal de material didático para ser utilizado em sala de aula acompanhando a classificação indicativa da obra (14 anos).


Nota: 6,5

Post a Comment

Postagem Anterior Próxima Postagem