A primeira temporada de The Handmaid's Tale (2017) introduz o regime totalitário de Gilead e assusta por sua distopia não estar tão distante da realidade.

Ao longo das próximas semanas lançaremos as críticas das três primeiras temporadas da série da Hulu, The Handmaid’s Tale. Como a nova temporada estreia no dia 28 de abril, nada melhor do que relembrar os principais fatos desse show que tem sido de longe um dos melhores dramas da atualidade.

A série americana criada por Bruce Miller é baseada na incrível obra literária de Margaret Atwood, chamada no Brasil de O Conto da Aia. A obra da Hulu teve sua primeira temporada lançada em 2017 e contou com 10 episódios.

SPOILER ALERT

A história se passa num futuro próximo e distópico. Os Estados Unidos vivem uma guerra civil e estão sob lei marcial. Com o caos instaurado, vê-se o nascimento de uma república totalitária em um território denominado por eles como Gilead, que é marcado por um regime ultraconservador e cristão. Com as taxas de fertilidade caindo drasticamente, como resultado da poluição, uso de agrotóxicos e do aumento de infecções sexualmente transmissíveis, a elite que está no poder em Gilead recruta à força mulheres férteis para servirem a eles como Aias. A função da Aia consiste basicamente em procriar e isso é feito por meio de um ritual (cerimônia) baseado em uma interpretação bíblica grotesca, numa tentativa imbecil de justificar aquilo que é visivelmente um estupro. Outras mulheres também são capturadas e distribuídas em outras funções, algumas, por exemplo, são enviadas para locais que eles chamam de colônias.

Nesse contexto, temos a protagonista dessa narrativa, June Osborne (Elisabeth Moss). Separada da filha de forma violenta, ela é renomeada como Offred, que significa “de Fred”, enfatizando a questão da posse e a misoginia enraizada no regime de Gillead. As mulheres não têm direito de ir e vir, à leitura, nem nada que as coloque em uma posição de destaque, ou principalmente, superior a dos homens. Fred Waterford (Joseh Fiennes, Shakespeare Apaixonado) é um dos comandantes em Gilead e é casado com Serena (Yvonne Strahovski, Chuck). Esta, por acreditar ser infértil, aceita a presença de June em sua casa na certeza de que a Aia dará um filho ao casal.

Vendo assim, a trama parece algo completamente fictício e exagerado. No entanto, conforme os episódios passam, percebemos que existem sim pessoas ao nosso redor como aquelas que idealizaram o regime totalitário em Gilead e isso dá muuuuuito medo.

Elisabeth Moss encarna com perfeição uma mulher disposta a tudo para recuperar sua filha desaparecida, Hannah (Jordana Blake), inclusive a agir friamente, aproximando-se de forma calculista de seu comandante a fim de achar uma maneira eficaz de encontrá-la. A atriz está na performance da sua vida e consegue transmitir os sentimentos com o olhar, de uma maneira única. Os takes fazem questão de evidenciar isso, focando muito em seus olhos, de forma que conseguimos sentir a dor dela, o ódio e a revolução que cresce em seu interior.

Aproveitando o gancho, aqui aplaudo os demais quesitos técnicos de The Handmaid’s Tale. A começar pelo figurino marcante, a paleta de cores que aposta em tons fechados a exceção do vermelho extremamente vívido que contrasta com perfeição e remete ao feminino, mas também à luta e ao sangue. Quando vamos para os flashbacks, as cores quentes se acentuam, para destacar tudo aquilo que foi perdido, em especial a alegria e a liberdade. A adaptação do roteiro é feita com maestria e cada episódio traz uma mensagem essencial.

Outra personagem marcante nessa temporada é Emily (Ofglen), interpretada por Alexis Bledel (Gilmore Girls). Emily é acusada de traição de gênero, levantando na série uma pauta extremamente pertinente que é a da homofobia. Assistimos como os extremistas religiosos tratam esse tema e percebemos que não é tão diferente do que vemos no mundo real, já que ainda hoje milhares de pessoas perdem suas vidas simplesmente por amarem alguém do mesmo gênero. Seu arco é encerrado com uma dolorosa cena que retrata a mutilação genital feminina, que, devo lembrá-los, por mais chocante que possa parecer, não se atém a ficção e é autorizada ainda hoje em alguns países.

Aos poucos vamos descobrindo que existe um movimento que quer encontrar o momento certo para se rebelar e é esse sopro de esperança que vai nos movendo em meio a tantas cenas duras. June e Moira (Samira Wiley), amiga que ela tinha antes mesmo do regime se iniciar e que ela acabou encontrando em Gilead, tentam escapar uma vez, mas apenas Moira consegue embarcar no trem. A punição para June é pesada, como tudo na vida daquelas mulheres.

Um dos episódios mais chocantes da temporada mostra quando uma comitiva do México visita a casa do comandante Waterford. June vê ali a oportunidade de pedir socorro, mas a grande decepção é quando descobrimos que outras nações procuram replicar exatamente o mesmo método utilizado com as Aias e, portanto, não estão nem um pouco preocupados com o que está acontecendo de fato em Gilead. 

Outro ponto abordado pela série é como Luke (O.T. Fagbenle), esposo de June, consegue escapar para o Canadá e como faz de tudo para tentar resgatar sua esposa e filha. É por ele que vemos como a tomada do país foi violenta e como não será fácil para June abandonar os EUA, já que suas fronteiras estão fortemente protegidas. Apesar do amor existente entre os dois, anos se passam e June acaba se envolvendo com Nick (Max Minghella), motorista do comandante. Ao final da temporada a Aia descobre estar grávida dele, mas claro que essa parte da paternidade foi omitida de Fred.

A primeira temporada termina, portanto, repleta de ganchos e possibilidades. Sim, ficam questões em aberto, mas não enxergo isso como um problema, já que boa parte é respondida em temporadas futuras e o objetivo aqui é exatamente instigar e permitir ao espectador especular acerca de possibilidades. Considero a introdução mais que ideal para esse mundo, que apesar de distópico, é tão atual. As atuações são fascinantes e a mensagem profunda. Não é à toa que essa temporada faturou inúmeros prêmios, incluindo o Emmy de melhor série dramática, atriz para Elisabeth Moss, e atriz coadjuvante para Ann Dowd que interpreta a intimidadora tia Lydia.

As três primeiras temporadas da série estão disponíveis no Globoplay.

Nota: 10,0

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