Mesmo com "piada" inapropriada, Ginny & Georgia entrega uma história repleta de pautas importantes e consegue divertir.

Família sempre é uma pauta infalível no universo televisivo e cinematográfico. Até porque cada um de nós sabe, por experiência própria, que tretas não faltam se tratando desse tema! Quando a abordagem é voltada especialmente para a conexão existente entre mãe e filha, o produto pode ser algo realmente marcante, desde que retratado com os devidos cuidados. 

Um exemplo bem sucedido dessa temática foi uma das séries de maior sucesso de todos os tempos, Gilmore Girls (Tal Mãe e Tal Filha, 2000). Nela, Lorelai (Lauren Graham) e Rory (Alexis Bledel) são mãe e filha e têm uma relação divertida, profunda e por vezes conflituosa. O resultado são cenas hilárias e também emocionantes, das quais é impossível se esquecer. Para essa fórmula dar certo todavia, é necessário um elenco de fato afinado para que consigamos nos enxergar nas situações, torcer pelos personagens envolvidos e, acima de tudo, nos conectarmos à trama. Como verá a seguir, é exatamente isso que acontece em Ginny & Georgia, a mais nova série original da Netflix.

Ginny & Georgia é uma comédia dramática americana criada por Sarah Lampert e Debra J. Fisher e estreou na Netflix no dia 24 de fevereiro deste ano. A série conta com dez episódios e sua produção é assinada por Claire Welland.

Ginny e Georgia são os nomes das protagonistas dessa divertida e tocante história. Georgia Miller (Brianne Howey) é mãe de Virginia – Ginny – (Antonia Gentry), uma adolescente que está no ensino médio, e do caçula Austin (Diesel La Torraca), um fofíssimo (nem sempre tão fofo) menino que mais parece a versão diminuta do Harry Potter. Após o falecimento de seu último marido, Georgia decide se mudar com sua família em busca de um recomeço, que mais a frente descobrimos ser algo recorrente na vida deles. Como eles se mudam com frequência, é difícil para eles criarem raízes, efetivarem vínculos, no entanto, dessa vez tudo indica que pode ser diferente.

Georgia é uma mulher extremamente inteligente, expansiva, mas também é calculista, manipuladora e está longe de ser a mãe perfeita, pelo contrário. Muitas de suas atitudes são extremamente questionáveis e dúbias, por outro lado, seu passado não foi nada fácil, marcado por abusos e uma gravidez ainda na adolescência. Aos poucos compreendemos que ela é capaz de tudo para manter os filhos seguros e ao lado dela. O desafio do momento é conseguir receber a herança do falecido, já que está sob disputa judicial e, claro, enquanto isso, sobreviver à maratona de dívidas que não param de chegar.

Ginny puxou e muito a sua mãe, ainda que discorde dos comportamentos dela e, por essa razão, elas têm frequentes embates. Filha de um pai negro e de uma mãe branca, ela convive com os desafios diários de estudar em uma escola majoritariamente branca sem esquecer suas origens. Somado a isso, ela precisa lidar com os inúmeros segredos da mãe, a dificuldade de se enturmar em um lugar completamente diferente dos anteriores e vivenciar as primeiras experiências amorosas.

A série é repleta de camadas e pautas. Por um momento achamos que Ginny é aquele tipo de filha mais madura do que a mãe, contudo aos poucos percebemos que não é bem assim. Georgia é fruto de um meio que a forçou a utilizar caminhos alternativos, ainda que desonestos, para sobreviver. E uma pessoa cuja vida toda se resumiu a fugir, obviamente terá extrema dificuldade em se abrir para o amor e confiar nas pessoas. Os relatos de abuso no decorrer dos episódios podem ser gatilhos, então fiquem atentos. 

A questão racial abordada no arco escolar de Ginny é muito bem trabalhada. Vemos desde a estudante que chega e se posiciona contra um professor que tem falas e atitudes visivelmente racistas, como também o racismo velado, até aos poucos percebermos a transformação da personagem que acaba sendo moldada pelo meio no qual está inserida a ponto de mudar seu cabelo, jeito de vestir, não por simplesmente gostar daquilo, mas sim para agradar aqueles que a cercam. 

As cenas entre Ginny e Georgia funcionam muito bem. O timing e entrosamento das duas é acertado, os diálogos fluem naturalmente, são convincentes e confirmam que elas são realmente peças chaves para o roteiro fluir. Os coadjuvantes têm tramas paralelas igualmente interessantes. Max (Sara Waisglass) é a vizinha e melhor amiga de Ginny. Ela é a figura caricata da série. Inicialmente você até pode se incomodar com alguns excessos, mas isso é tão tipicamente adolescente, que aos poucos ela se torna um alívio cômico extremamente necessário ao enredo. Seu irmão, Marcus (Felix Mallard), é um dos interesses amorosos de Ginny e também tem seus dilemas pessoais, misturados à rebeldia da idade, que movimentam a história e confundem os sentimentos da jovem.

Temos ainda aquele triângulo amoroso onde é praticamente impossível escolher um para quem torcer na conquista do coração de Georgia e envolve o prefeito da cidade, Paul (Scotte Porte), e Joe (Raymon Ablack), aquele amigo gentil de todas horas que é dono da cafeteria local.

Além de racismo e abuso, outros temas importantes são tratados tais como o bullying, evidenciado por Austin que acaba cada vez mais acumulando traumas e isso reflete completamente em sua personalidade, bem como a bulimia, as dificuldades de aceitação do corpo e a sexualidade (esses últimos presentes no arco das amigas de Ginny).

A série não é marcada apenas por acertos. Algumas vezes o roteiro perde o tom ao fazer “piadas” bastante inapropriadas e, acima de tudo, desnecessárias. Uma das que viralizaram nas redes e acabou levando a série a receber críticas negativas foi a de cunho sexista envolvendo o nome da cantora Taylor Swift. Que adolescentes falam besteira, todos sabemos, mas depreciar a imagem de uma artista é completamente inadequado e deselegante, o que vai de encontro totalmente com o que a série tenta pregar. Um erro grave.

Boa parte do roteiro é ágil e dinâmico, porém não dá pra negar que o meio da série é marcado por algumas barrigas propositais cujo objetivo é deixar certos desfechos somente para os episódios finais.

Ainda que com problemas pontuais, Ginny & Georgia encontra sim sua personalidade e entrega uma boa série afinal de contas. Os ganchos e possibilidades para a segunda temporada são excelentes e ficamos na torcida pela renovação da série.

Agora conta aí nos comentários se você é time Paul ou Joe. Ahhh conta também se é time Marcus ou Hunter!

 

Nota: 7,5 

 

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