Dickinson gira em círculos e deixa para os episódios finais sua relevância.

Dickinson encerrou sua segunda temporada na última semana. Pra quem não sabe, a série do Apple TV+, que estava sendo exibida semanalmente pelo streaming, teve sua renovação para terceira temporada anunciada antes mesmo do lançamento da segunda. A princípio acreditei que isso seria uma excelente notícia, no entanto agora já não tenho mais tanta certeza. Motivos? Falarei a seguir. Respire fundo e venha comigo.

Imagine uma série promissora, mas que perde em parte seu rumo. É exatamente essa a situação em que se enquadra Dickinson. Pra te situar, vamos a um breve review. No final da primeira temporada, descobrimos que Sue (Ella Hunt) está grávida, pouco antes dela se casar com Austin (Adrian Enscoe), o primogênito da família Dickinson. A jovem mantém em segredo essa informação e a confidencia exclusivamente a Emily (Hailee Steinfeld). Esta, por sua vez, convive com o luto da perda de Ben (Matt Lauria). Em outro arco, o pai de Emily retorna de Washington, após abrir mão de sua posição política, e pai e filha reatam a relação. Durante a conversa ele demonstra que finalmente não lutará contra o desejo da filha de escrever.

Na nova temporada, Emily continua com sua vida e você vai acompanhá-la em uma luta interna para decidir entre publicar ou não seus poemas. DEZ episódios girando em torno disso. A série que antes esbanjava criatividade, aqui pareceu carecer de ideias e girar em círculos.

Se você pensava que o pai de Emily seria o principal obstáculo para sua publicação, se engana. Edward (Toby Huss) se tornou outro homem nessa temporada, o que me pareceu uma mudança e tanto para o personagem. O amor dele por Emily nunca esteve em questionamento e isso sempre foi enfatizado ao longo da série, mas ele de um homem rígido se tornar um progressista, me pareceu um salto muito grande e inconsistente. Não sendo mais o pai o grande obstáculo, agora o entrave da vez é a própria Emily, que vê o espírito de um homem (que ela leva a temporada inteira para de fato compreender quem é) questioná-la o tempo todo a cerca do sucesso. Será que o reconhecimento realmente é o que importa ou ela deveria permanecer escrevendo sem esperar um retorno?

Por si só a história de Emily se tornou maçante e cansativa. Seu arco ficou empobrecido porque, ao contrário da temporada passada, a protagonista não envolveu sua vida ativamente na trama de outros personagens, nem ao menos contou histórias diferentes com as quais pudemos criar empatia. Resumidamente, ela se dividiu entre remoer a dúvida quanto a seus poemas e seu novo interesse amoroso. A história só alavanca nos dois últimos episódios, quando finalmente ela entende o que se passa a sua volta, entende suas visões e pensamentos e tem plena convicção do que sente. Não que ela precisasse de solucionar todos os seus problemas já no início da temporada, mas o roteiro deveria ter encontrado vias menos enfadonhas e preguiçosas para prender nossa atenção.

Outro ponto negativo a ser ressaltado nessa temporada é a descaracterização dos personagens. Para começar Sue. É impossível reconhecer na jovem a mesma Sue da temporada anterior. Percebe-se que o desfecho de sua gravidez, somatizada ao amor recluso por sua melhor amiga, interferiram em seu comportamento e personalidade, porém a um custo muito alto. A personagem que antes cativava, causa agora desconforto e age como uma megera muitas vezes. Aonde já se viu a Sue sendo mesquinha, esnobe e mimada? Não há fundamentação nem trauma suficiente pra isso e a série perde tremendamente com essa personalidade dúbia, ainda que no último episódio da série ela renasça como uma fênix. Austin, por sua vez, que se dividia entre imaturidade e despreocupação, agora, repentinamente, se preocupa com causas sociais.

Não dá pra negar que, apesar de ir de encontro a uma realidade biográfica, uma das grandes expectativas da série se encontra na relação entre Emily e Sue. O fandom das duas é gigantesco e, sem dúvida, responsável pela boa audiência. Mas com relação ao ship, sinto dizer que a série entrega pouco, se considerarmos que essa é a segunda temporada de uma história que não parece ser longeva. É como se o roteiro conduzisse o público em “banho Maria” e só no último episódio (que é o melhor da série ao garantir um show de química e atuação de Haylee e Ella) decidisse desenvolver esse arco, como se pra capturar a audiência para temporada seguinte.

A amizade das duas é colocada à prova ao fim da segunda temporada tendo como pivô o sedutor Samuel Bowles (Finn Jones). O ator, que ficou conhecido na série Punho de Ferro (2017), entrega um personagem que divide a opinião no decorrer da trama e somente se revela por completo ao final.

A Sra. Dickinson (Jane Krakowski) e sua filha Lavinia (Anna Baryshnikov) garantem as risadas e tornam o show um pouco mais palatável durante os inúmeros episódios fillers. A personagem materna finalmente encontrou o fio da comédia e Lavinia novamente arrasa, agora com mais tempo de tela e um apetite sexual bastante aflorado.

Às vésperas da Guerra Civil americana e com as tensões se aflorando, minha expectativa era de que essa atmosfera fosse mais aproveitada no enredo, juntamente com as questões políticas inerentes, contudo tal abordagem engrena, assim como todo o resto, apenas nos episódios finais. Uma pena.

Na terceira temporada espero que a emoção não se atenha apenas aos desfechos. Pra mim, episódio filler só é tolerado em séries de mais de vinte episódios, como Grey's Anatomy, por exemplo. É claro que o carisma de Hailee é a mola propulsora de Dickinson, no entanto, depender somente disso e de um ship, pode levar a série a se tornar esquecível. 

 

Nota: 6,0

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