Na alvorada dos anos 80, Francis Ford Coppola recebeu uma carta assinada por 300 alunos do ensino médio pedindo para que ele dirigisse um filme baseado no livro "The Outsiders" da autora S.E Hinton, Coppola leu o livro e decidiu comprar os direitos para produzir a adaptação. O que foi filmado foi uma translação quase idêntica do livro para tela, porém no corte final do estúdio foram reduzidos 22 minutos do filme. Em 2005, Coppola foi convidado a passar "Vidas Sem Rumo" para turma de colégio de sua neta, e sabendo que a turma era constituída por fãs do livro que conheciam a obra de cor, Coppola desenterrou o corte original e passou para a turma, da qual nenhum aluno foi capaz de apontar uma única cena do livro ausente em sua adaptação cinematográfica. Prontamente, Coppola procurou a Warner Bros. e em 2005 foi lançado o corte do diretor de "Vidas Sem Rumo".
"Vidas Sem Rumo" se passa nos anos 50 e conta a história de Ponyboy Curtis e seu amigo Johnny Cade, dois greasers (subcultura de jovens rebeldes de classe trabalhadora) que se envolvem num problema além de suas capacidades após um conflito com os socs ("social playboys" garotos ricos que gostam de atacar greasers).
Com 1h 54m onde seu corte para cinema tinha apenas 1h 31m, o corte do diretor de "Vidas Sem Rumo" segue todas as batidas narrativas do livro adaptado com maestria e mostra o quão bem Coppola domina a arte de adaptar uma obra literária para as telas. Em sua crítica do filme em 1983, o crítico Roger Ebert escreveu:
O material narrativo fino de "Vidas Sem Rumo" cria um filme de apenas 90 minutos, e mesmo assim há cenas que parecem ser para matar tempo. Nada que acontece no filme parece necessário; é tudo arbitrário.
Tal problema não se aplica a versão lança em 2005. Cada ação de cada personagem conta uma história maior, nada é arbitrário, e mesmo pequenas falas remanescentes do livro servem para aumentar o escopo da obra, é possível sentir que todos os personagens viveram vidas inteiras antes dos eventos do filme, sendo eles a melhor ferramenta narrativa usada.
Quase todo o elenco de atores em "Vidas Sem Rumo" foi constituído por atores com menos de 25 anos, e Coppola pega seu elenco pouco experiente e extrai deles todo o potencial de atuação, de C. Thomas Howell ("Amanhecer Violento") interpretando um Ponyboy totalmente crível, Matt Dillon ("O Selvagem da Motocicleta") representando com perfeição o personagem de Dallas Winston, mas o verdadeiro destaque sendo Ralph Macchio ("Karatê Kid - A Hora da Verdade") em seu primeiro filme para cinema fazendo a melhor performance do elenco como um Johnny Cade saltando diretamente das páginas da obra de S.E Hinton, dá aparência até a interpretação de um adolescente frágil que viveu uma vida difícil. Patrick Swayze ("Ghost - Do Outro Lado da Vida") como Darrel Curtis e Rob Lowe ("Parks and Recreation") dão tudo de si na interpretações dos irmãos mais velhos de Ponyboy, ambos que demonstram seu amor fraterno de formas muito diferentes. Mesmo Tom Cruise ("De Olhos Bem Fechados") e Emilio Estevez ("Clube dos Cinco") com personagens menores contribuem a obra de forma mais que satisfatória.
Famosamente, Coppola colocou os atores que interpretariam os socs num hotel melhor que o elenco principal dos greasers, e chegou a dar menos dinheiro a seus astros em busca de criar autenticidade na sensação de segunda classe vivida pelos greasers no filme. O quanto essa decisão influenciou as performances é difícil apontar, mas é inegável a incrível direção de atores e o quão as interpretações preencheram lacunas na história do filme. Apenas ver personagens conversando dá ao público um belíssimo insight sobre suas vidas, você realmente acredita que esses são garotos que viveram pobres a vida toda e tiveram que assistir os socs ganharem tudo de bandeja.
Apesar disso, o fato de ser uma transposição idêntica do livro adaptado não é totalmente benéfico a adaptação. Em uma das cenas, Cherry Valance, a personagem de Diane Lane ("O Homem de Aço") se refere a um personagem de uma maneira sem sentido, enquanto no livro temos a narração de Ponyboy dando sua opinião sobre a personagem e explicando o que ele entendeu, no filme, mesmo com as interpretações dizendo muito, fica tudo a quem do expectador de entender o que Cherry quis dizer. Pequenos exemplos disso podem ser visto durante o filme, mas 9 a cada 10 são relevados graças aos atores.
Por mais que "Vidas Sem Rumo" seja aclamado como uma pérola da década de 80, ele não passa a sensação de se estar vendo um filme dos anos 80, e isso é para o melhor. É uma obra atemporal, um filme feito décadas atrás passado décadas antes de sua época, mas cuja história pode se conectar com qualquer jovem que o assistirá no futuro.
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