"A Escavação" consegue comover com suas atuações marcantes e fotografia impecável.
Arqueologia é um assunto que sempre encanta! Quando esse tema entra na fórmula, as chances de sucesso são altas, ainda mais quando se acrescenta um elenco brilhante na equação. Apesar de ser comumente visto em filmes que envolvem aventura e ação, como em Indiana Jones (1981), A Múmia (1999) e Lara Croft: Tomb Raider (2001), nada como um bom drama para trazê-lo à tona.
A Escavação (The Dig) é um drama que chegou ao catálogo da Netflix no dia 29 de janeiro de 2021. Dirigido pelo australiano Simon Stone e tendo Moira Buffini como responsável pelo roteiro, o longa é adaptado a partir do romance homônimo, The Dig, de 2007, escrito por Jonh Preston e narra a escavação de Sutton Hoo, em 1939.
A história retrata Edith Pretty (Carey Mulligan), uma viúva, mãe do pequeno Robert (Archie Barnes) e dona de terras em Sutton Hoo, na Inglaterra. Ela contrata um escavador, Basil Brown (Ralph Fiennes), para descobrir o que há embaixo de alguns montes localizados em sua propriedade, uma vez que ela tem uma intuição muito forte de que há algo em ao menos um deles.
Trabalhando com o auxílio de outros dois funcionários, Brown descobre ali um navio de origem anglo-saxônica, que ao que tudo indica, possivelmente servia como túmulo para um grande rei ou guerreiro. A interessante descoberta logo atrai a atenção e, por ser considerada um achado de importância nacional, logo outros arqueólogos aparecem para além de interferir, assumirem de vez a escavação.
Em meio a tudo isso, temos como pano de fundo a Segunda Guerra Mundial que está prestes a se iniciar trazendo consigo todo o temor e comoção, bem como o desafio de uma mãe que tem uma doença incurável e está com o tempo de vida contado e, por isso, teme pelo destino de seu filho.
O drama tem um ritmo bastante monótono e por algum tempo você acredita que não conseguirá extrair muita coisa dele. Entretanto, aos poucos você compreende que apesar de lento, o filme vai criando raízes e consolidando relações. Dessa forma, o arco principal que envolve Edith, seu filho e Basil se torna comovente. O menino se sente culpado por não conseguir “salvar” a mãe, algo que segundo ele seria seu dever, desde o falecimento de seu pai. Ele enxerga em Basil uma fonte de inspiração e ali nasce uma relação quase parental. O resultado são diálogos que exalam uma ternura única. É curioso como o filme é construído com longas sequências silenciosas. E isso só é possível, pois os olhares e movimentos são suficientes para que captemos a essência dos personagens.
A partir de sua metade e com a chegada de outros arqueólogos à escavação, o filme começa a desenvolver tramas paralelas, como a de Peggy (Lily James) e Rory (Johnny Flynn). Peggy é chamada a escavação e por vezes ignorada no processo, simplesmente pelo fato de ser mulher. Somado a isso, ela vive um casamento infeliz, com um homem que omite sua sexualidade, e encontra em Rory, primo de Edith, uma possibilidade de amar verdadeiramente. Apesar dessa parte do filme deixar um pouco de escanteio seu protagonista, não dá pra negar que ela insere um romantismo capaz de dar uma movimentada na trama compassada demais. Vale ressaltar, que em alguns momentos os personagens parecem narrar seus próprios pensamentos de forma sobreposta às cenas, de um jeito pouco convencional em longa metragens. Esse recurso dá um caráter mais intimista e aproxima o telespectador do personagem e seus desejos.
Ralph Fiennes é um ator brilhante. Com indicações ao Oscar por sucessos como O Paciente Inglês (1996) e A Lista de Schindler (1993), e que ficou ainda mais conhecido por sua interpretação do famoso vilão da saga de Harry Potter, Voldemort, Ralph é orgânico como Basil Brown, um arqueólogo e escavador introvertido que segue os passos de seu pai e avô de forma mais autodidata e que luta pelo reconhecimento de seu trabalho. Ele encarna um homem verdadeiramente apaixonado por sua profissão e que desenvolve uma afeição genuína por aquela família.
Não dá pra falar desse filme sem mencionar as críticas que circularam na imprensa com relação à escalação de Carey Mulligan. A atriz, de 35 anos, vive uma personagem de 56 anos (PASMEM!) e para isso foi envelhecida através de maquiagem, o que obviamente não foi suficiente para atingir o objetivo. É legal deixar claro que a atuação dela é fantástica, embora não diminua o impacto do fato, visto que esse acontecimento comprova a tese de que cada vez mais atrizes acima dos quarenta anos perdem espaço em Hollywood. Nomes não faltavam para assumir esse papel, no entanto, parece incômodo para muitos produtores colocarem mulheres reais e que tragam as marcas naturais de envelhecimento para se apresentarem nas películas. É como se essas atrizes fossem simplesmente descartáveis para o mercado. Uma pena. Uma atitude a ser censurada sim!
O filme que caminha de forma lenta, mas quase artesanal, tem seu último terço carregado de emoção e com cenas de uma profundidade e leveza quase místicas, que fazem definitivamente valer a pena a parte enfadonha do roteiro, além de arrancarem lágrimas. Com uma fotografia espetacular, que talvez seja o carro chefe do filme, A Escavação traz uma bela mensagem de continuidade e de como a morte não necessariamente é o fim, a exemplo daquele navio que está lá por gerações e traz consigo suas marcas e histórias a serem contadas. O passado, o presente e o futuro enfim conversam entre si.
Nota: 7,0
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